Intervenção militar no RJ é acirramento do golpe
- Opinión
Qual é a justificativa real da “intervenção militar” na segurança pública do Rio de Janeiro? Qual é o fato de relevante ofensa à ordem pública identificado no Estado que não exista em qualquer outro local do país? Não existem respostas plausíveis ou razoáveis para estas duas perguntas. Li atentamente a fala de Michel Temer (PMDB) sobre o assunto e não encontrei nada, absolutamente nada que justificasse a intervenção na administração de uma Unidade Federativa da importância e do porte político desse Estado.
Os argumentos de Temer são frágeis, tanto que o mesmo fala na possibilidade de suspender o Decreto de intervenção para votar a Reforma da Previdência. Ora, se existem fatos tão graves que autorizam a usurpação da autonomia federativa e justifiquem uma intervenção, estes se sobrepõem a qualquer outra votação de política econômica e fiscal dentro do Congresso. Senão, por que intervir?
Em Decreto recheado de inconstitucionalidades, o que fica evidente é a tentativa de transformar o Rio de Janeiro em “balão de ensaio” para o acirramento da violência do estado e início da ofensiva contra a resistência civil frente ao Golpe executado em 2016.
A tentativa de desmoralizar a principal liderança da esquerda, Luiz Inácio Lula da Silva, mediante julgamento farsesco, fracassou. Está cada vez mais evidente para quem ainda não tinha entendido, que o Brasil vive em regime de exceção, diria que com ares totalitários na esfera judicial, e o valente trabalho da escola de samba “Acadêmicos do Tuití” acabou escancarando com arte e humor este fato para o mundo inteiro.
O problema do aumento da violência no Rio é o mesmo que afeta São Paulo, Rio Grande do Sul, Distrito Federal e outros locais do país: a politica econômica de Temer e Meirelles. Mais nada. No Rio Janeiro a situação parece mais grave porque o fim da nacionalização da indústria do petróleo e do gás quebrou o Estado. Não existe nenhum estado no Brasil que dependa tanto dos recursos da Bacia de Campos e do Pré-sal como o Rio de Janeiro. No momento em que a indústria naval foi destruída e a Petrobrás e o Pré-sal foram entregues ao capital financeiro internacional, o Estado quebrou, externalizando todas as suas mazelas. O processo de desmonte da Petrobrás que é executado com rigor pela 13ª Vara da Justiça Federal de Curitiba e pelo Governo Temer, colocaram em crise a economia de um dos Estados que mais crescia na era Lula/Dilma.
Outro fator que impulsionou os números de violência no Rio e em outros estados foi o fim dos programas oficiais de inclusão. A dívida social com cariocas e fluminenses é muito grande e ações como o Programa Nacional de Segurança Pública e Cidadania – PRONASCI, que além de aparelhamento policial oferecia inclusão produtiva até para egressos do sistema prisional, deixaram de existir. Ninguém mais fala em “polícia pacificadora”, em “policiamento comunitário”, “reurbanização de favelas” ou qualquer outra ação de caráter democrático ou inclusivo. A resposta de Temer é sempre a mesma: mais violência e uso das forças militares.
Além de tudo, não existe, no nosso regime jurídico, a figura da “intervenção militar”. O ato de intervenção previsto na Constituição de 1998 “é civil”. Então, entregar o comando da segurança pública do Rio para autoridade militar é algo absolutamente inconstitucional, é um verdadeiro estado de defesa disfarçado.
Com isto, claramente, o objetivo golpista é outro, iniciar o desmonte da ordem civil e começar a perseguição às forças populares de resistência, preparando a substituição paulatina e articulada do modelo político. Os alvos são as entidades de classe, associações de bairro, movimentos sociais e todos aqueles que se opõem ao Golpe, mediante a instauração de um regime de medo.
Se o objetivo de Temer fosse realmente acabar com o tráfico a ação poderia ser bem mais simples: investigar e prender os agentes financeiros que lavam o dinheiro do crime organizado. Mas essas pessoas não moram no morro, sem habitat é outro, em lugares mais chiques e badalados da cidade.
Sandro Ari Andrade de Miranda, advogado, mestre em ciências sociais.
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