Diz dirigente do MST

‘Não podemos ter um Fora Temer negociado com militares, sem eleições diretas’

O crime que ele está cometendo entregando o patrimônio nacional é algo que não podemos aceitar.

02/10/2017
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João Paulo Rodrigues
Foto: Guilherme Santos/Sul21
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A Frente Brasil Popular lançou, quinta-feira (28) à noite, na Assembleia Legislativa gaúcha, o Plano Popular de Emergência, um conjunto de propostas para superar a crise e “restabelecer a ordem constitucional democrática, defender a soberania nacional, enfrentar a crise econômica, reverter o desmonte do Estado e salvar as conquistas históricas do povo trabalhador”. O ato teve as participações especiais da presidente da União Nacional dos Estudantes, Marianna Dias, do integrante da direção nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), João Paulo Rodrigues, e do presidente da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, Edegar Pretto (PT).

 

Um pouco antes do início do ato de lançamento do Plano Popular de Emergência, João Paulo Rodrigues conversou com o Sul21 sobre o atual momento da conjuntura nacional e sobre alguns dos principais desafios que estão colocados para os movimentos sociais, após pouco mais de um ano de consolidação do governo Temer. O dirigente do MST reconhece que a pauta do “Fora, Temer” não vem mobilizando setores mais amplos da classe trabalhadora e da população em geral, mas defende a necessidade de mantê-la no centro da agenda política:

 

Não há condições de mantê-lo lá mais um ano e meio. É muito tempo. É preciso pensar nos estragos que ele vai causar na vida da população. A minha posição e a do MST é Fora Temer. Não temos dúvida sobre isso. Mas não podemos ter um Fora Temer negociado com militares, sem eleições diretas. Ter um Fora Temer com o Maia assumindo por via indireta é algo que não aceitamos”.

 

Sul21Em que consiste o Plano Popular de Emergência que está sendo lançado pela Frente Brasil Popular?

 

João Paulo: A Frente Brasil Popular reúne aproximadamente 64 organizações, entre partidos, sindicatos e movimentos sociais. Ao longo do último ano, a Frente se dividiu em três grandes partes. A primeira é responsável por organizar as lutas de resistência contra o golpe e contra as reformas golpistas. A segunda se encarrega da parte organizativa e a terceira, por fim, tem a tarefa de construir um programa que pudesse sistematizar as principais ideias do que nós defendemos para o Brasil e servir como um documento para orientar a nossa militância.

 

Esse ato aqui em Porto Alegre foi convocado para lançar esse plano de emergência, que é dividido em vários capítulos e tem como eixo básico apresentar para a sociedade qual a nossa posição sobre o tema das políticas públicas, do orçamento, do papel do Estado e sobre as reformas que defendemos. Além disso, esse programa tenta fazer uma análise do modelo econômico vigente no Brasil e apresentar as linhas gerais da política econômica que defendemos. É extremamente importante que tenhamos eventos como este para a população saber que a Frente Brasil Popular e os seus movimentos não fazem apenas uma luta contra, mas também a favor das ideias que compõem esse plano.

 

Sul21Você poderia citar alguns exemplos das ideias e propostas que integram esse plano?

 

João Paulo: Nós somos favoráveis à convocação de uma Constituinte para fazer mudanças no sistema político brasileiro. Nós achamos que a reforma política tem que contemplar a realização de referendos e a criação de espaços de decisão que não se resumam ao Congresso Nacional e envolvam a participação da população. Na área da segurança pública, nós defendemos a desmilitarização da polícia militar e a criação de uma polícia que não seja tão repressora como esta que temos hoje. Também propomos mudanças para a democratização do Judiciário. Os movimentos sociais têm um acúmulo muito grande em temas envolvendo a reforma agrária e a agricultura familiar. Por fim, também estamos defendendo a revogação de todas as medidas golpistas tomadas pelo governo Temer.

 

Sul21Após pouco mais de um ano do afastamento da presidenta Dilma Rousseff, qual o balanço que você faz deste período de governo Temer? Tivemos, recentemente, um general defendendo a possibilidade de uma intervenção militar no país. Essa é uma ameaça real, na sua opinião?

 

João Paulo: Estamos vivendo um período muito difícil na sociedade brasileira. Alguns economistas e intelectuais falam de uma tempestade perfeita que combina quatro grandes crises muito delicadas. Temos uma crise de caráter econômico gravíssima que iniciou com a crise financeira internacional de 2008 e atingiu o Brasil com força a partir de 2013. Além disso, temos uma crise política onde a sociedade não se sente mais representada por este Congresso que está aí. É o Congresso mais caro da história da República. O custo da eleição dos atuais representantes chega a quase R$ 5 bilhões, sem que houvesse melhora alguma para a população. Em terceiro lugar, é uma crise social. Temos altos índices de desemprego e um aumento da desigualdade social e da violência. Por fim, temos problemas ambientais de longa data conhecidos por todos, em especial pelos camponeses.

 

A forma como Temer chegou ao poder, através de um golpe, piorou ainda mais a situação que já se arrastava nos últimos cinco anos. A avaliação da Frente Brasil Popular é que não há condições de ter nenhum tipo de melhora na conjuntura política, enquanto não rompermos com esse ciclo golpista. Precisamos tirar esse governo e colocar outro eleito pelo voto popular. O segundo componente da crise, em relação ao qual precisamos tomar muito cuidado, é justamente o tema das eleições em 2018. Está em curso, como parte do golpe, uma tentativa de não deixar Lula concorrer à presidência nestas eleições. Se Lula não for candidato a presidente em função de uma decisão judicial, em especial da famosa República de Curitiba, a tendência é que essa crise continue.

 

Só há uma chance de a direita e os setores conservadores fazerem um governo com maior tranquilidade: é deixar o Lula ser candidato e ganhar dele nas urnas. Se isso não acontecer, creio que teremos um capítulo ainda mais profundo de crise e de contradição. Se Lula concorrer e ganhar a eleição, não significa que vai acabar com a crise, mas ela assume outra natureza, dentro do campo democrático.

 

No plano da economia, o Brasil está passando por um dos piores momentos de sua história. Os índices do governo Temer apontam o maior rombo de orçamento desde 1997. Há um furo no orçamento de mais de R$ 90 bilhões. Esse modelo econômico que eles estão imponto vai afundar ainda mais o Brasil. Esta semana, eles privatizaram metade das empresas que geram energia no sistema Cemig, entregando-as para o capital internacional. Está mantida mais uma rodada de negociação para o mês de outubro.

 

A parte boa da conjuntura política é a disposição de luta por parte dos vários movimentos de trabalhadores. Se o governo Temer voltar com a pauta da Reforma da Previdência, organizaremos uma nova greve geral entre os meses de outubro e novembro. No próximo dia 3 de outubro, pretendemos fazer uma jornada de luta, com um grande ato no Rio de Janeiro contra a venda do patrimônio nacional. Entre os dias 16 e 20 de outubro, pretendemos fazer uma grande mobilização nos municípios contra a Reforma da Previdência e a venda do patrimônio nacional. As centrais sindicais, da CUT à Força Sindical, já anunciaram que, se o governo pautar a Reforma da Previdência, haverá uma nova greve e um movimento Ocupa Brasília.

 

Sul21Tivemos nos últimos meses grandes mobilizações de rua e uma greve geral forte, reunindo movimentos sociais, sindicatos, partidos, movimento estudantil e organizações populares. Mais recentemente, porém, parece que essa mobilização arrefeceu um pouco. Como vê esse quadro atual e a capacidade de mobilização dessas organizações?

 

 João Paulo: Acho que nós não conseguimos explicar ainda para a população o que, de fato, está em jogo. Houve agora uma grande mobilização contra a extinção da Renca e a venda da Amazônia, mas foi uma mobilização só da classe média. Os trabalhadores não se interessaram por esse tema. A esquerda apostou no “Fora, Temer”, mas esse tema também não contagiou os trabalhadores. O “Fora, Temer” também virou uma pauta importante da classe média. Quando a Globo entrou no circuito, também defendendo o “Fora, Temer”, confundiu um pouco esses setores. Eu creio que os trabalhadores só participam de mobilizações envolvendo temas que os interessem diretamente, como a reforma trabalhista e a reforma da previdência. Mesmo agora, no momento em que estamos no meio de uma confusão envolvendo a reforma política, debatendo temas como o distritão e o fundo de financiamento de campanhas, a população não está participando desse debate e não demonstra muito interesse. Ela não acredita nestas mudanças paliativas.

 

A forma como a direita recuou da pauta da reforma da previdência também contribuiu para desmobilizar o calendário de lutas que tínhamos programado para o próximo período. Se essa pauta retornar, a mobilização retornará com força também. Em relação ao “Fora, Temer”, os trabalhadores e a população em geral parecem estar pensando: a gente tira o Temer e põe quem no lugar? O Rodrigo Maia? O presidente do Senado? A população também faz a sua análise de conjuntura. Não basta as direções de nossas organizações convocarem mobilizações sem entender direito o que ela está pensando.

 

Há ainda setores do campo progressista que apostam que é melhor um Temer sangrando para ter uma possibilidade de acumular força e ter uma vitória em 2018, do que tirá-lo agora e embolar o meio do campo com uma representação que possa fazer algum tipo de pacto nacional. Temer, com uma aprovação de 3%, como disse o deputado Valmir Assunção, não tem índice de popularidade, mas sim margem de erro.

 

Sul21Você se alinha entre estes que acham que é melhor deixar Temer sangrando até 2018?

 

João Paulo: Não. Eu sou da tese de que precisamos tirar o Temer de lá. Não há condições de mantê-lo lá mais um ano e meio. É muito tempo. É preciso pensar nos estragos que ele vai causar na vida da população. A minha posição e a do MST é Fora, Temer. Não temos dúvida sobre isso. Mas não podemos ter um Fora, Temer negociado com militares, sem eleições diretas. Ter um Fora, Temer com o Maia assumindo por via indireta é algo que não aceitamos. A dúvida é: teremos força para tirar Temer e antecipar as eleições? Mas, independente disso, defendemos o Fora, Temer. Mantê-lo no governo não é sangrá-lo mais, mas sim sangrar os trabalhadores. Já vimos esse filme em outras ocasiões e não deu certo. Além disso, o crime que ele está cometendo entregando o patrimônio nacional é algo que não podemos aceitar.

 

setembro 30, 2017

https://www.sul21.com.br/jornal/nao-podemos-ter-um-ifora-temeri-negociado-com-militares-sem-eleicoes-diretas-diz-dirigente-do-mst/

 

https://www.alainet.org/es/node/188356
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