Resistência ao golpe dá oxigênio ao governo
Por fim, apesar de toda a campanha da mídia grande, a palavra golpe pegou.
- Opinión
A semana que começou com uma derrota para o governo, na terça-feira em que o PMDB anunciou o rompimento, termina com uma conjugação de fatos que avisam ao outro lado: O jogo ainda não acabou.
As manifestações de ontem foram as maiores já realizadas em defesa da democracia e em apoio à presidente Dilma, com ganhos de representatividade para a frente política contra o impeachment, que ultrapassa o petismo e o sindicalismo. A presença e a fala de Chico Buarque no palanque do Rio foram o mais forte simbolismo disso.
Se o clamor pelo impeachment no dia 13 deu impulso ao processo na Câmara, o de ontem, contra a deposição da presidente, também será ouvido pelos partidos, na semana crucial em que Dilma e o ex-presidente Lula devem avançar nas articulações para uma recomposição do governo que proporcione os votos para a barragem do processo no plenário da Câmara. O fato de haver massas protestando contra o impeachment facilita a tomada de posição por deputados que alegavam ser impossível apoiar o governo com “o povo todo contra”. Não é o povo todo, claro está. Neste momento, Lula e outros articuladores conversam com PP, PSD, PR e partidos menores. É neste “centrão” que podem colher os 100 votos fundamentais para ganhar o jogo com um mínimo de segurança. Se a oposição precisa colocar em plenário 342 votos, o governo pode montar sua barragem com votos contra, com abstenções e ausências. Lula dialoga ainda com setores do PSB, velho aliado que se transferiu para a oposição.
Ele também termina a semana com uma boa vitória, a decisão do STF que manteve no âmbito da mais alta corte as investigações iniciadas pelo juiz Moro. A decisão liminar de Gilmar Mendes contra sua posse não foi ainda examinada mas agora ele não será abatido, enquanto articula a salvação do governo, por uma ordem de prisão preventiva de Moro - que por sinal levou uma sova do STF com as condenações veementes à sua divulgação ilegal das conversas grampeadas de Lula, inclusive com Dilma. Lula iria participar do ato de Brasília. Mas sensatamente desistiu para não parecer uma provocação ao STF, que à tarde decidiria sobre o questão do foro. Gravou porém aquele vídeo, objetivo e curto, em que apenas pediu união em defesa da democracia e da legalidade.
Mas antes ainda desta quinta-feira, Dilma colecionou manifestações de alta ressonância contra seu impedimento, do alto e da base da pirâmide brasileira. Um ministro do STF, Marco Aurélio Mello, deu-lhe razão: “sem crime de responsabilidade é golpe mesmo”. Na quarta, durante o lançamento da fase 3 do Minha Casa Minha Vida, pessoas simples do campo e da cidade, de movimento por moradia, juntamente com o sanguíneo Guilherme Boulos, do MTST, entoaram o “não vai ter golpe” no Palácio do Planalto. Ontem o ato se repetiu com a entrega de manifestos por intelectuais e artistas como Beth Carvalho, Letícia Sabatella, Aderbal Freire-Filho, Ana Muylaert, Sergio Mamberti, Ana Maria Magalhães e tantos outros. Wagner Moura publicou um artigo contundente contra o impeachment. Professores e estudantes protestaram na USP, na UFRJ e em outras universidades. Advogados peitaram a OAB na entrega de um oportunista pedido de impeachment adicional. Juristas continuaram sustentando que não há crime de responsabilidade. Em Lisboa o seminário promovido pelo ministro Gilmar Mendes e líderes da oposição foi alvo de um protesto de brasileiros. Aliás, emigrados brasileiros voltaram a se manifestar pela democracia em várias capitais do mundo. No campo adversário, nenhuma manifestação importante mereceu registro.
Por fim, apesar de toda a campanha da mídia grande, a palavra golpe pegou. A ideia de que o impeachment com base em pedaladas fiscais é apenas o mandato legal para um golpe contra Dilma, logo contra a vontade popular, ganhou força ao longo da semana. Foi isso que fez as manifestações crescerem comparativamente com as do dia 18.
E daí, isso mudará votos na Câmara? Ninguém pode responder positivamente, até porque ninguém sabe ao certo quantos votos há contra ou a favor do impeachment. Mas certamente o clima melhorou para o governo. Quando Collor, no curso do impeachment, cometeu a frase “não me deixem só”, o que colheu foi um grande protesto com as pessoas vestindo preto, e não verde-amarelo, como ele pedira. As manifestações de ontem disseram que Dilma não está só. Isso não fará diferença para a oposição que comanda o processo, juntamente com Eduardo Cunha e agora com o vice Michel Temer. Mas fará para aqueles partidos da base governista que vinham sendo tentados pelo efeito manada.
Mas há sempre um imponderável no ar: a Lava Jato.
- Tereza Cruvinel, colunista do 247, é uma das mais respeitadas jornalistas políticas do País
1 de Abril de 2016
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