Uma epidemia de violência assola a América Central: segunda anotação

16/10/2011
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Pelos países da América Central se espalham quadrilhas de criminosos juvenis, chamadas de maras. São assustadoramente violentas. Onde sua presença é de pouca significância, como a Costa Rica, paira o medo generalizado de que a qualquer hora brotem feito cogumelos depois da chuva. São delinqüentes comuns, não necessariamente vinculados ao tráfico de drogas, e suas ações se estendem até as comunidades de imigrantes instaladas na Califórnia e pelo sul dos Estados Unidos.

Na América Central, cada hora um país é mencionado como o que tem as maras (assim, no feminino) mais cruéis. Neste primeiro semestre de 2011, e sem menosprezo do que padecem os vizinhos, a Guatemala manteve-se na liderança das macabras contabilidades da morte e na expansão das maras e também de narcotraficantes. Um dos nós do problema é ter um Estado débil, que não se consolidou após 36 anos de guerra civil, e que por sua fragilidade acaba favorecendo a criminalidade enquanto assiste, impotente, à instalação em seu território de importantes cartéis do vizinho México. O país virou uma espécie de entreposto febril de empresários da droga, que atuam ao amparo da impunidade, que por sua vez é conseqüência da impotência do Estado. A Guatemala fica na rota entre os produtores de cocaína da América do Sul e o maior mercado mundial de consumidores, os Estados Unidos. É passagem quase obrigatória para a droga, e o cenário ideal para lavar dinheiro.

Lá, nota-se claramente a conjunção dos problemas que afetam todos os países da América Central, começando pela fragilidade do Estado, e passando pela escassa eficácia das forças de segurança. A exemplo dos vizinhos, o país padece o tremendo desequilíbrio entre a pobreza generalizada e a riqueza formidável dos cartéis de traficantes que, acossados em seu país de origem, se instalaram em seu território. Além do mais, os cartéis têm uma estrutura sólida, um rigoroso sentido de disciplina e obedecem à rígida hierarquia militar com melhores resultados – são mais coesos e eficientes – que as próprias forças de segurança.

Não é possível, porém, falar dessa epidemia que fora da região é praticamente ignorada, sem mencionar dois fatores. O primeiro deles é a situação dos países que se encontram nos extremos da América Central – o México ao norte, a Colômbia ao sul.

Historicamente, o México é um grande produtor de maconha e um mediano produtor de heroína. Quase não produz cocaína, e só a partir da segunda metade dos anos 90 os cartéis se aproveitaram, com rapidez e enorme eficiência, do vazio deixado pelos até então donos do negócio, os poderosos grupos colombianos. Além da Colômbia, Peru e Bolívia asseguram abastecimento para os cartéis mexicanos, que hoje controlam 95% da cocaína consumida nos Estados Unidos.

Há uma diferença notável entre os cartéis mexicanos e os colombianos. Graças à sua associação com a guerrilha, iniciada no final dos anos 70, os da Colômbia têm presença rural e já não atuam diretamente no mercado norte-americano. Sua grande força está no cultivo e na produção. Com o desmantelamento dos cartéis de Cali e de Medellín, as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – as FARC – passaram a controlar as áreas de cultivo e os corredores de exportação. Optaram por não atuar junto ao mercado consumidor. Fornecem aos mexicanos, que em seu país controlam as zonas urbanas, principalmente as vizinhas à fronteira de três mil quilômetros com os Estados Unidos. As autoridades de Washington asseguram que o lucro dos mexicanos roça a casa dos 16 bilhões de dólares por ano.

Com um negócio desse vulto nas mãos, os cartéis estendem sua presença na América Central, principalmente em El Salvador e na Guatemala. Traçam sua logística de forma meticulosa: bons estrategistas, tratam de ter a maior segurança possível para que o transporte de seu produto não enfrente sobressaltos ao longo do caminho.

Há outra característica da mudança no controle do tráfico feito pelos mexicanos. Dentro e fora do país, cada vez mais ganha espaço e força o grupo Los Zetas, cuja origem está nas tropas dos serviços especiais do exército, treinados pelos norte-americanos. Se os antigos cartéis aceitavam negociar com políticos, juízes, policiais e militares corruptos, Los Zeta são mais seletivos na hora de dividir seus lucros. Preferem espalhar o terror, através de atentados brutais e assassinatos massivos, a distribuir dólares.

Mantêm distância das maras. Procuram recrutar, nos países centro-americanos, companheiros de formação, ou seja, integrantes de brigadas especiais das forças armadas locais, treinadas pelos Estados Unidos para matar e sobreviver nas piores condições. O argumento na hora de recrutá-los é simples e direto: multiplicam seu soldo por cinco. Os recalcitrantes, os resistentes a esse argumento, são eliminados.

Outros fatores para o crescimento da violência e do tráfico de drogas nos países da América Central são a miséria, a omissão do Estado, a falta de perspectivas para a maior parte dos jovens. Desamparados, sem futuro à vista, descobrem que trabalhar para a mais que bem sucedida empresa do tráfico de drogas é uma alternativa sedutora e concreta. Outra opção é tentar ser admitido nas maras. Em qualquer das opções morre-se muito cedo. Saber disso faz com que sejam de uma violência desmedida.

Assim, há uma atmosfera extremamente propícia para que a epidemia de violência que sacode a região se estabeleça e cresça, à sombra de um futuro que cada vez é mais negado, à sombra de uma paz cada vez mais impossível.

É uma vertigem sombria, um turbilhão que parece não ter fim.
 
 
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