A feira de saldos dos títulos gregos (II)
- Opinión
Eric Toussaint entrevistado pelo CADTM
CADTM: Dizes |1| que desde a crise de maio de
Eric Toussaint: Isso influencia o preço de venda dos antigos títulos da dívida grega que são trocados no mercado secundário ou no mercado de rua.
A isto é preciso acrescentar outra consequência, ainda mais importante – a Grécia tem duas opções:
a) Resignar-se a continuar a recorrer à Troika (FMI, Banco Central Europeu, Comissão Europeia), a fim de obter financiamentos a longo prazo (10-15-30 anos), submetendo-se ao jugo desta;
b) Recusar as imposições dos mercados e da Troika, suspendendo o pagamento e iniciando uma auditoria a fim de repudiar a parte ilegítima da dívida.
CADTM: Antes de abordarmos a escolha entre essas duas opções, vamos esclarecer algumas questões: o que é o mercado secundário?
Eric Toussaint: Tal como acontece com os carros usados, existe um mercado de segunda mão para as dívidas.
Os especuladores e os fundos especulativos (hedge funds) compram e vendem títulos ao portador no mercado secundário ou no mercado de rua. Os especuladores são de longe os principais actores
A última vez que a Grécia emitiu títulos a prazo de 10 anos foi a 11 de março de 2010, antes do início dos ataques especulativos e da intervenção da Troika. Em março de 2010, para obter 5000 milhões de euros, a Grécia comprometeu-se a pagar um juro de 6,25% por ano até 2020. Nesse ano, deverá reembolsar o capital emprestado. Desde então, como já vimos, a Grécia não contrai empréstimos a prazo de 10 anos nos mercados, porque as taxas de juro dispararam. Quando nos dizem que as taxas de juro a 10 anos subiram para 14,86% (foi o que aconteceu a 8 de agosto de 2011, quando a taxa grega a 10 anos regressou abaixo dos 15% após a intervenção do BCE, após ter atingido 18%), temos uma indicação sobre o preço a que são trocados os títulos a 10 anos no mercado secundário.
Os especuladores que compraram títulos em março de 2010 tentaram livrar-se deles no mercado secundário, uma vez que esses títulos se tornaram de alto risco na possibilidade de a Grécia ficar incapaz de reembolsar o valor dos títulos no prazo previsto.
CADTM: Concretamente, no caso dos títulos a 10 anos emitidos pela Grécia, como é que se fixa o preço de mercado corrente?
Eric Toussaint: O quadro seguinte permite compreender o que significa na prática o anúncio de que a taxa de juro grega a 10 anos atingiu os 14,86%. Vejamos um exemplo concreto: admitamos que um banco comprou títulos gregos em março de 2010 no valor de 500 milhões de euros. Imaginemos que cada título vale 1000 euros. O banco receberá portanto uma remuneração anual de 62,5€ (ou seja 6,25% de 1000€) por cada título de 1000€. Diz-se no jargão do mercado dos títulos da dívida que um título dá direito a um cupão de 62,5€. Estamos em 2011, e actualmente os títulos a prazo de 10 anos emitidos pela Grécia em março de 2010 são considerados de alto risco, pois não é nada certo que a Grécia consiga reembolsar o capital emprestado em 2020. Logo, os bancos que têm muitos títulos gregos, como o BNP Paribas (que em julho de 2011 detinha ainda um valor equivalente a 5000 milhões de euros), Dexia (3500 milhões), Commerzbank (3000 milhões), Generali (3000 milhões), Société Générale (2700 milhões), Royal Bank of Scotland, Allianz ou os bancos gregos revendem os títulos que possuem no mercado secundário, porque têm demasiados activos duvidosos, especulativos (junk bonds) ou simplesmente tóxicos nos seus balanços. Para tentar simultaneamente acalmar os seus accionistas (para que estes não vendam na bolsa as suas acções), os clientes que depositaram as suas poupanças (para que estes não as retirem) e as autoridades europeias, têm de se desfazer do máximo possível de títulos gregos que foram adquiridos até março de
|
Valor nominal do título a 10 anos emitido pela Grécia em 11-03-2010 |
Taxa de juro em 11-03-2010 |
Valor do cupão pago todos os anos ao detentor dum título de 1000€ |
Preço do título no mercado secundário em 8-08-2011 |
Remuneração efectiva à data de 8-08-2011 (Yield) se o comprador comprou um título de 1000€ por 420,50€ |
Exemplo |
1000,00€ |
6,25% |
62,5€ |
420,50€ |
14,86% |
Em resumo: o comprador não dá mais de 420,50€ por um título de 1000€, para conseguir obter um juro real de 14,86%. Os banqueiros acima citados não estão dispostos a vender a esse preço.
CADTM: Disseste que os especuladores revendem os títulos gregos. Tens ideia dos montantes de que se desfizeram?
Eric Toussaint: Na tentativa de reduzir os riscos tomados, os bancos franceses diminuíram em
CADTM: Que faz o Banco Central Europeu nesse respeito?
Eric Toussaint: O BCE serve inteiramente os interesses dos banqueiros.
CADTM: Como?
Eric Toussaint: Comprando títulos gregos no mercado secundário. O BCE compra aos bancos privados que querem desfazer-se dos títulos da dívida grega com uma margem que chega aos 20%. Paga cerca de 800€ para adquirir um título que valia 1000€ no momento da emissão. Ora, como mostra o quadro precedente, esses títulos valem muito menos que isso no mercado secundário ou no mercado de rua. Não é difícil perceber porque é que os bancos apreciam tanto que o BCE lhes ofereça 800€ em vez do preço de mercado. Aí está mais um exemplo do fosso enorme que separa as práticas dos banqueiros privados, bem como dos dirigentes europeus, do seu discurso sobre a necessidade de deixar operar livremente as forças do mercado para fixar os preços.
notes articles:
|1| Este artigo está incluído numa série de sete artigos. Ver a primeira parte http://www.cadtm.org/A-Grecia-no-ce...
|2| A 25 de agosto de
infos article
URL: http://www.cadtm.org
Traduzido por Rui Viana Pereira, revisto por Noémie Josse-Dos Santos.
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