Auto-gestão do FSM é vacina contra fracionamento da esquerda
26/01/2009
- Opinión
Dando seqüência à série de entrevistas e reportagens com opiniões de especialistas sobre os rumos do Fórum, o Brasil de Fato entrevistou Chico Whitaker, membro do Secretariado Internacional do Fórum
De volta ao Brasil depois de 5 anos, o Fórum Social Mundial 2009, em Belém (PA), deve ser marcado por discussões acerca da crise do modelo econômico mundial e os danos ao meio-ambiente causados pela busca incessante pelo lucro. Entre 27 de janeiro e 1º de fevereiro, cerca de 120 mil pessoas participam das 2,6 mil atividades que serão realizadas nas universidades Federal do Pará (UFPA) e Federal Rural da Amazônia (UFRA).
Brasil de Fato - Quais foram as principais motivações que levaram a se escolher Belém como a sede o FSM 2009?
Chico Whitaker - A escolha de Belém foi uma decorrência natural da decisão de vir para uma região do mundo na qual incidem de maneira intensa todas as conseqüências trágicas da lógica econômica perversa que hoje o conduz: a busca do lucro a qualquer preço, depredando a natureza, explorando os trabalhadores, destruindo culturas originárias. Por outro lado, os olhos de todo o planeta estão voltados para essa região, pelo papel que ela cumpre no seu equilíbrio ecológico. E, ao voltar ao Brasil, em Belém, no extremo norte, depois de vários fóruns realizados em Porto Alegre [RS], no seu extremo sul, a dinâmica desse processo poderá reativar muitas das lutas que se travam no Brasil todo por "um outro mundo possível", permitindo que as articulações que o Fórum torna possíveis se apóiem em novas convergências nacionais e internacionais que lhes darão mais força transformadora. Por último, ao voltar para o Brasil, se chamará a atenção para o que está ocorrendo na América Latina, continente no qual o voto popular está apontando para mudanças políticas necessárias, alimentando a esperança em todo o mundo.
Inicialmente, se falava num fórum com uma característica mais ambiental, pelo fato de o aquecimento global ter imposto uma agenda "verde" até para os mais conservadores. O que a organização do FSM fará para que o tema não seja atropelado pelas discussões acerca da crise financeira internacional?
O Fórum Social Mundial é sempre auto-gestionado, com atividades que são propostas pelos seus próprios participantes, de baixo para cima, e não pelos seus organizadores – que se auto-intitulam "facilitadores" – de cima para baixo. E ele sempre aborda o conjunto de problemas que o mundo enfrenta, e não somente uma de suas dimensões. Se, no entanto, alguns deles se sobressaírem no conjunto, é por que a consciência dos participantes dos Fóruns o ressentem como mais importante. No caso concreto se constatou, pela inscrição de atividades que foi feita, que nenhuma discussão atropelará as demais. E é interessante notar que várias delas apontam para a crise civilizatória que o mundo está vivendo, na qual todos esses aspectos têm que ser considerados em seu conjunto.
Como o FSM pretende ligar a crise aos danos ao meio-ambiente?
O FSM não liga nada a nada. Ele não é um movimento ou uma entidade, com seus programas próprios. São os seus participantes que fazem tais tipos de ligação. E se muitos estão se propondo a discutir a crise civilizatória do mundo atual, é por que estão querendo justamente buscar novos paradigmas em que tudo interfere em tudo, com a solução dos problemas exigindo mudanças estruturais.
De que forma o Fórum pretende apontar alternativas à crise financeira mundial?
De novo tenho que dizer que o Fórum enquanto espaço aberto de encontro não aponta nada. Quem o aponta são os seus participantes, nas discussões e intercâmbios que farão durante o Fórum. Temos portanto que esperar que ele se realize para ver que alternativas serão apontadas.
Qual deve ser o formato do Fórum? Deve haver um documento final?
O Fórum de 2009 comportará uma série de inovações metodológicas positivas, como o aumento de um dia na sua duração, para que seus participantes possam tratar nesse dia especificamente da problemática amazônica e como a realização de assembléias no último dia para a formulação de propostas de ação. Na prática, também se avançou bastante no processo de inscrição de atividades, uma vez que quase um mês antes do Fórum o programa geral já se encontra à disposição de todos, para que melhor organizem sua participação e seus contatos e identifiquem mais facilmente as articulações possíveis. Sempre no formato de somente atividades auto-gestionadas, avançou-se também na integração entre atividades culturais e os debates. Mas, como sempre, não haverá um documento final do Fórum enquanto Fórum. Esse é um dos princípios básicos de sua Carta, que funciona como uma vacina contra a divisão que é o que destrói os movimentos de esquerda. Em compensação, se espera que se multipliquem ao máximo os "documentos finais" das redes de organizações participantes, a partir das propostas de ação que tenham discutido, engajando plenamente quem os adote.
O Fórum ainda pretende firmar-se como um contraponto a Davos ou admite a idéia de trabalhar em conjunto em alguns temas?
O Fórum nasceu como um contraponto a Davos e continuará sempre sendo esse contraponto, na medida em que a visão de seus participantes sobre o mundo é antagônica a dos participantes de Davos. Impossível, portanto, trabalhar em conjunto com Davos, inclusive porque ambos são espaços e não entidades, não tendo portanto cúpulas representativas ou direções que falem ou decidam em nome desses participantes.
Por fim, você acha que a crise, de alguma forma, pode afetar a própria realização do Fórum, com redução do número de participantes internacionais ou problemas de estrutura?
Já ficou demonstrado, pelo número de participantes e atividades inscritas, que a crise não afetou a realização do Fórum. Se tudo continuar correndo bem como aconteceu até agora, o FSM de 2009 será um dos melhores que já foram realizados.
Fonte: Brasil de Fato
https://www.alainet.org/es/node/132014
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