Solidariedade aos grevistas da Volks

03/09/2006
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A pouco mais de um mês das eleições presidenciais, a multinacional alemã Volkswagen distribuiu cartas de demissão para 1.800 operários da sua unidade em São Bernardo do Campo, no ABC paulista. Além da sua forma fria, o anúncio do facão foi nitidamente antecipado e provocativo – já que os trabalhadores só poderão ser dispensados em 21 de novembro, data em que termina o acordo de estabilidade firmado entre o sindicato e a empresa. Diante desta atitude prepotente, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) suspendeu o empréstimo previsto de R$ 497,1 milhões à montadora e a assembléia dos metalúrgicos aprovou, por unanimidade, a deflagração de greve por tempo indeterminado. O episódio, que faz parte da encarniçada luta entre capital e trabalho, adquire assim uma nítida conotação eleitoral. Não é para menos que Geraldo Alckmin, candidato da direita, tenta tirar proveito da desgraça alheia ao responsabilizar o governo Lula pelas demissões. ''A culpa é dos juros'', afirmou, hipocritamente, o presidenciável do partido dos banqueiros, o PSDB. Já José Serra, candidato tucano ao governo paulista, ironizou o fato das demissões ocorrerem no ABC paulista, ''o berço do presidente Lula''. Na mesma linha eleitoreira, a senadora Heloísa Helena defendeu que ''o BNDES tem a obrigação'' de fazer empréstimos à multinacional alemã, o que deve ter causado calafrios aos anticapitalistas do PSOL e do PSTU. A postura truculenta da Volks deveria merecer o rechaço de todos os trabalhadores e patriotas e não servir para oportunismos eleitorais. As demissões fazem parte de um plano de reestruturação da multinacional e não tem relação direta com a política econômica brasileira. Visam aumentar a lucratividade com o corte de pessoal e a retirada de direitos. Tanto que estão previstas quase 20 mil dispensas na unidade da Volks na Alemanha, além de cortes drásticos na Espanha, Portugal e México. Este plano internacional revela a ambição da montadora, que é recordista de exportações no Brasil e detém boa fatia do mercado interno – pagando sete vezes menos aos metalúrgicos brasileiros do que aos operários da sua matriz alemã. Uma guerra prolongada A atitude do governo Lula de suspender o empréstimo foi correta. ''Se a empresa não atende aos objetivos do Estado nacional, o BNDES não deve dar crédito'', reconheceu Carlos Lessa, ex-presidente do banco e um ácido crítico do governo. Com esta atitude legítima e decidida, o governo demonstrou que não aceita o “terrorismo eleitoral” da Volks, que utiliza a mesma tática do crime organizado (PCC) para pressionar o poder público. Luis Marinho, ex-operário da empresa e atual ministro do Trabalho, foi o pivô da enérgica resposta. “O BNDES vai suspender o empréstimo enquanto a negociação não se consolidar”, garantiu. O financiamento tinha sido aprovado em abril e possuía uma cláusula sobre a preservação dos empregos. Mais justa ainda foi a postura corajosa dos metalúrgicos, que não se acovardaram diante da truculência da multinacional e decretaram a greve. ''Não vamos aceitar perda de direitos. Se o trabalhador tiver que cair, que caia de pé'', afirmou José Lopez Feijóo, presidente do sindicato. As assembléias têm sido massivas e a orientação aprovada é para os operários ingressem na fábrica e permaneçam de braços cruzados. O clima entre os 12 mil metalúrgicos é de revolta. Cerca de metade dos dispensados está com problemas de saúde, o que atesta a provocação da empresa e atenta contra a legislação em vigor. “Essas demissões são pressão psicológica”, protesta o operário Lenivaldo Targino, que estava de licença médica devido a sua tendinite. Levando em conta que o plano de reestruturação da montadora é estrutural e mundial, e não conjuntural e local, a luta dos operários da Volks deve ser prolongada. A multinacional anuncia milhares de demissões e faz chantagem com a retirada de direitos. Seu “pacote de maldades” inclui reajuste do plano de saúde em 200%, redução em 35% da tabela salarial dos novos contratados, terceirização de inúmeros setores, congelamento do aumento real em 2006/07, apenas uma folga fixa semanal e a eliminação do descanso da equipe da pintura. “Pautas de reivindicação” também foram apresentadas nas unidades da Europa, sempre com a ameaça da transferência da fábrica para países com força de trabalho mais barata e desorganizada. Urgência do apoio ativo Nesta luta prolongada, os cinco sindicatos que representam os metalúrgicos das cinco unidades da Volks no Brasil – São Bernardo, Taubaté, São Carlos, Resende (RJ) e Curitiba (PR) – têm procurado atuar de forma unitária, independentemente da central a qual estão filiados. Além das passeatas e protestos de rua, eles pressionaram os poderes públicos a interferirem na contenta – por isso, elogiaram a reação soberana e enérgica do governo Lula – e articularam a resistência internacionalmente, realizando várias reuniões com os comitês de metalúrgicos da Volks dos outros países. Com a deflagração da greve em São Bernardo, em 29 de agosto, todas as centrais sindicais emitiram manifestos de apoio e têm participado das assembléias. Há consenso de que o plano de reestruturação da Volks não se limita a São Bernardo. Anunciado em maio passado, ele prevê 5.773 demissões, incluindo as outras unidades da multinacional no país. Além disso, a dispensa numa montadora logo impacta toda a cadeia produtiva. Como 27 setores industriais estão ligados à fabricação de um veículo, estima-se que este facão afetará outros 245 mil trabalhadores. Consideradas suas famílias, a decisão da multinacional poderá vitimar 660 mil pessoas. Afora as demissões, o plano macabro da empresa recoloca a discussão sobre os direitos trabalhistas num patamar ainda mais perigoso. Diante de uma guerra que promete ser prolongada, a solidariedade ativa passa a ser decisiva. Afinal, o que está em jogo é o futuro das relações do trabalho no Brasil. “Se o sindicato ceder em São Bernardo, vai ser um desastre generalizado para toda a classe trabalhadora no Brasil”, explica o sociólogo Sadi Dal Rosso, da Universidade de Brasília. Neste caso, a tendência é que haja uma nova onda do capital de precarização do trabalho. “É preciso a união de todos os sindicatos, não só dos metalúrgicos”, conclama Carlos Alberto Grana, presidente da Confederação dos Metalúrgicos da CUT. Algumas entidades já marcaram protestos diante das revendedoras da Volks nos Estados. É nesta hora que se mede a solidariedade classista! - Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB, editor da revista Debate Sindical e autor do livro “As encruzilhadas do sindicalismo” (Editora Anita Garibaldi, 2ª edição).
https://www.alainet.org/es/node/116851
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