Diario da Bolivia (II)
O MAS se prepara para governar
17/12/2005
- Opinión
1. Que importância pode ter a vitória de Evo Morales na eleição deste domingo?
Neste momento circulam pesquisas que não podem ser divulgadas localmente, mas
que correm de boca em boca, multiplicadas pela casa que funciona como
coordenação central da campanha do MAS, que indicam que o candidato do partido
se aproxima dos 50. Algumas pesquisas indicam 45% contra 22% de Quiroga,
outros dizem que a proximidade da metade mais um dos votos é maior ainda.
Considerando que nas eleições anteriores Evo Morales subiu extraordinariamente
na fase final – “ajudado” pelas declarações desastradas do então embaixador
dos EUA na Bolívia, é certo – e que a margem de indecisos e dos que até aqui
afirmaram que votariam em branco ou nulo é significativo, de cerca de 20% e
que o favoritismo do candidato do MAS é reiterado por toda a imprensa, podendo
assim atrair votos, não é impossível que Evo seja eleito no primeiro turno.
Estranhamente as pesquisas mantiveram quase que os mesmos resultados nas
últimas semanas, em um país não tão acostumado a esse tipo de investigação.
Pode-se imaginar que houve mudanças nesta fase final, ainda que fosse o
debilitamento do candidato do MNR, situado em terceiro lugar, e dos outros
candidatos sem possibilidade de chegar ao segundo turno. As pesquisas
paralelas indicam uma subida de Evo da casa dos 34% para a dos 45%, com
Quiroga diminuindo e os outros estacionados. A expectativa é grande, mas tende
a se frustrar, em parte porque a apuração demorará várias semanas,
especialmente se faltarem alguns pontos para que Evo chegue ao objetivo de
triunfar no primeiro turno. Poderia dar-se a desistência dos outros
candidatos, diante de uma diferença clara a favor do candidato do MAS.
2. Evo Morales nasceu em 27 de outubro de 1959 – tem 46 anos – em Isallavi, no
cantão de Orinoca, no departamento de Oruro, com o nome de Evo Morales Ayma,
como um de sete irmãos de uma família aymara. Na comunidade em que nasceu, não
havia serviços fundamentais como luz, água, esgoto, seus pais, Dionísio
Morales Choque e Maria Ayma Mamani, viviam da agricultura e da criação de
lhamas. Quatro dos irmãos de Evo morreram, sobrevivendo até aqui 3 deles.
Evo estudou, jogou futebol e aprendeu música. Formou-se no colégio Béltran
Ávila, de Oruro, fez o serviço militar e depois foi viver na região do
Chapare, junto com seus pais, onde trabalhavam na produção de frutas. AS duras
condições de vida da sua família e do seu meio foram levando Evo a tomar
consciência social da situação dos indígenas, sendo ele mesmo vítima da
discriminação e da repressão, por ser cocaleiro. Começou a participar da
atividade sindical em 1983, quando foi nomeado secretário de esportes de seu
sindicato, em Porto São Francisco. Em 1988 assume a secretaria executiva da
Federação do Trópico, envolvendo-se cada vez mais com a atividade sindical.
Defende a defesa dos recursos naturais, a defesa dos direitos humanos e a luta
pela justiça social, com referencias de sua atividade política, ascendendo do
sindicato à federação e à presidência das 6 federaçõs de Cochabamba, onde
conhece grande parte dos trabalhadors mineiros da década de 1970-80, que
buscavam refúgio e trabalho na região do Chapare, de quem apreende a
experiência histórica do movimento mineiro boliviano.
A partir de 1990 Evo participa da Central Operária Boliviana, passando a
incorporar as posições estratégicas da direção da COB, de tomada do poder pela
aliança operário-camponesa. Se aproxima mais dos dirigentes dos sindicatos
cocaleiros, quando começa a se colocar, junto a outros militantes, a
necessidade de criação de uma organização diretamente política, quando fundam
o Instrumento Político pela Soberania dos Povos – IPSP. Não conseguem
registrar legalmente a organização, mas Evo entra ao Movimento ao Socialismo
(MAS) e em 1997 é eleito para o Parlamento, onde se enfrenta aos partidos
tradicionais – MNR, MIR, ADN e outros – que terminam expulsando-o do
Congresso.
Em 2002 Evo se candidata à presidência da Bolívia, como primeiro líder
indígena a postular esse cargo, chegando ao segundo turno, contra Sanchez de
Losada, a quem o Congresso escolhe como presidente. As grandes manifestações
de 2003 derrubam a Sanchez de Losada e as deste ano derrubam também a seu
sucessor, Carlos Meza.
Nestas eleições o MAS escolheu a Álvaro Garcia Linera como candidato a vice-
presidente. Álvaro nasceu em 19 de outubro de 1962 – tem 44 anos -, estudou em
Cochabamba e em La Paz, concluindo seus estudos superiores no México, em
matemática. Ingressou na política através do Exército Guerrilheito Tupák
Katari, com um projeto de luta pelo poder através da luta guerrilheira. O
movimento é reprimido e derrotado, Álvaro foi preso e condenado junto a vários
dos seus companheiros, tendo ficado 5 anos na cárcere. Um dos mais importantes
intelectuais da nova geração na América Latina e o Caribe, Álvaro é o
principal teórico da estratégia de campanha e de governo do MAS.
3. Os correspondentes da imprensa internacional se centram na busca de
nomes, mais em particular naquele anuncio que caracterizou presidentes de
esquerda favoritos – como Lula e Tabaré Vazquez-, que anunciaram seu comando
da economia – sempre quadros moderados ou mesmo da direita -, principalmente
seu ministro da economia, para “tranqüilizar o mercado”. Nem Evo Morales, nem
Álvaro Garcia – este o quadro mais qualificado da equipe de governo do MAS -,
se prestam a isso, pelo menos até agora. Trataram de acalmar a investidores
das empresas petrolíferas, mas mantendo a decisão de nacionalização das
empresas de hicrocarburos.
O documento de propostas do MAS afirma, a esse respeito: “Nacionalização dos
hicrocarburos e dos recursos naturais para sua industrialização”. Parte do que
considera “a inconstitucionalidade dos contratos de risco compartilhado”, para
afirmar que “defenderemos frente a qualquer Corte Internacional a
obrigatoriedade da migração de contratos e não se aceitará nenhuma posição de
permanência ou prolongação do anterior regime de concessão.” Fica claro assim
que “todo o gás e o petróleo que se extrai devem ser entregues em propriedade,
ao Estado boliviano e o Estado boliviano será quem definas as condições
soberanas de utilização dos hidrocarburos”, incluindo “total liberdade para
determinar ou fixar os preços”.
Entre as propostas inovadoras do MAS está também a do Estado boliviano assumir
a industrialização do gás natural, “um faro histórico fundamental”, que
permitirá dar inicio a um processo de “superação de uma longa história que
consistiu em concentrar a atividade econômica na produção e exportação de
recursos naturais como matérias primas”. Serão priorizados o aumento da
produção, a industrialização do gás para obter o diesel ecológico, a
fabricação de plásticos e projetos de industrialização geral no período de
governo de 5 anos.
O outro pilar do programa do MAS é a convocação de uma Assembléia Nacional
Constituinte, em que “depois de 180 anos da história republicana, pela
primeira vez, os povos originários, os setores sociais e as minorias, terão a
possibilidade de participar em uma Assembléia que reflita a composição
multinacional e pluricultural de toda sua territorialidade”.
Com isso o MAS aspira a “um Estado com imagem e identidade moral e ética
baseada na simbiose, na interculturalidade, no equilíbrio e no respeito à
natureza com amor à vida, à liberdade e à sabedoria, para viver bem”. O MAS se
coloca o objetivo da “fundação do novo Estado, composto por nações milenárias
e pela diversidade de culturas, recuperando nossa herança milenária,
promovendo a revitalização das identidades, valores e saberes”.
É nesse cenário que uma indígena boliviana, com seu chapéu coco negro na
cabeça, disse aos correspondentes estrangeiros concentrados em La Paz: “Antes
vocês vinham aqui porque nós derrubávamos governos. Agora vêm porque vamos
eleger um novo governo.”
https://www.alainet.org/es/node/113878?language=pt
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