As arapucas do toyotismo (2)

20/04/2005
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As atuais mutações no mundo do trabalho não se dão apenas através da introdução de novas máquinas, da chamada automação microeletrônica. Também ocorrem a partir do uso das técnicas de gerenciamento, da mudança nos métodos de administração do trabalho. Tanto que hoje expressões como just-in-time, CCQ, kanban, administração-participativa e outros já fazem parte do vocabulário de milhares de trabalhadores, preocupados com o reflexo dessas arapucas nas empresas. Com estes métodos requintados, batizados de toyotismo, o capital não suga somente o esforço físico do trabalhador. Ele exige a sua própria alma! Geralmente, inclusive, as técnicas gerenciais são implantadas antes da própria introdução das máquinas informatizadas. No caso do Brasil, como país dependente, os empresários ou não dispõem dos recursos financeiros necessários ou temem comprar máquinas- ferramentas de tecnologia mais avançada prevendo as reações negativas ou seu uso indevido. Daí porque, para preparar o terreno para a introdução da nova maquinaria, eles preferem investir primeiro nas novas formas de organização do trabalho, contratando os serviços das inúmeras agências de consultoria em produtividade existentes no mundo. A frenética busca de novas técnicas de dominação, no Brasil e no mundo, não é recente. Ela acompanha o próprio desenvolvimento do sistema capitalista desde a sua gênese. O atual boom, entretanto, tem causas particulares. Para as empresas instaladas no país existem pelo menos duas motivações básicas. A primeira é que, observando o ritmo de produção das nações imperialistas, o patronato avalia que ainda há enorme potencial para o aumento da produtividade. As novas técnicas serviriam para sugar ao máximo o suor dos assalariados e para reduzir os custos operacionais com a redução de desperdícios, refugos e estoques. Outro motivo é a própria crise crônica do capitalismo mundial. Para competir num mercado estrangulado, os empresários sabem que é necessário intensificar e diversificar a produção, procurando atrair a atenção da pequena parcela de consumidores existentes no mundo. Segundo pesquisa do Banco Mundial, cerca de 20% dos aproximadamente 6 bilhões de habitantes da terra fazem parte desse restrito mercado capitalista. Isso exige maior flexibilidade na produção e maior capacidade competitiva, o que requer operários mais dóceis e aptos a contribuir com o patronato. Tudo é feito para envolver o trabalhador, criando um clima de “paz familiar” nas empresas, aonde não há mais explorados, mas sim “parceiros” e “colaboradores”. Origem do toyotismo No caso dos chamados países capitalistas desenvolvidos, a corrida em busca dessas novas técnicas é mais antiga. Data dos anos 50. O Japão, por suas características culturais, econômicas e políticas, foi o país que se lançou primeiro nesse esforço após a II Guerra. Ofuscando o brilho das escolas de administração da Europa e EUA, os empresários japoneses, auxiliados pelo Estado através do poderoso Miti (Ministério da Indústria e do Comércio Exterior), foram os que mais investiram nesse terreno, o que alavancou o seu famoso “milagre econômico” nos anos 80 e deu origem aos termos “toyotismo” ou “ohnoismo”. Para bater os seguidos recordes de produtividade, impondo ritmos alucinantes de produção, primeiro a burguesia japonesa castrou a resistência operária. Entre 1946/48 houve violenta repressão para “evitar o perigo comunista”. Ainda sob a intervenção do governo dos EUA, logo após a II Guerra, as greves foram rigorosamente proibidas pelo general Mac Arthur. Também ocorreram os “expurgos vermelhos”, com milhares de operários conscientes banidos dos sindicatos, expulsos das fábricas, presos e assassinados. Para domesticar os trabalhadores, enfraquecendo suas lutas, o governo e as empresas também impuseram o plurisindicalismo. Proibiram os sindicatos por ramos de produção, fortes antes da guerra, e estimularam os sindicatos por empresa. Os trustes econômicos (Zaibastsus) criaram inclusive os “segundos sindicatos” (Goyokiumiai) por local de trabalho, totalmente manipulados pelas chefias. Há mais de 78 mil sindicatos no Japão, numa organização totalmente fragmentada e frágil. A maioria faz parte da própria hierarquia das empresas, contribuindo para aplicar os novos métodos de gerenciamento dos patrões japoneses. O intenso processo de acumulação capitalista no Japão, que criou as condições para o salto tecnológico no período seguinte, ocorreu com base na brutal exploração de uma classe operária desorganizada e castrada. Aproveitando-se dessa fragilidade e de outros fatores culturais e históricos, o patronato encontrou terreno fértil para desenvolver inúmeros mecanismos de manipulação ideológica, que posteriormente provocaram tanta admiração do capital no mundo todo. A burguesia ficou encantada com a disciplina e humildade do trabalhador japonês que, quando doente, pede licença para que sua empresa não tenha prejuízo, faz horas extras gratuitas e canta hinos de saudação aos patrões, como na poderosa indústria Matsushita. “Para construir um novo Japão, Trabalha duro, trabalha duro; Aumentamos nossa produção, Vamos enviá-la a todas as nações Sem trégua, sem repouso; Como um gêiser, Jorra a nossa indústria; Sinceridade e harmonia É isso a Matsushita Eletric”. A partir do final dos anos 60, o sucesso desses novos métodos foi reconhecido e passou a ser difundido nas outras potências capitalistas. As várias escolas existentes na Europa e nos EUA, como a da psicologia industrial, recursos humanos ou a sócio- técnica, receberam maiores recursos financeiros para pesquisar a realidade do mundo do trabalho e propor alterações na busca da elevação do nível de produtividade. A “ameaça japonesa” estimulou a generalização das novas técnicas de dominação no interior da empresas. A difusão do toyotismo também refletiu o aumento da resistência operária às velhas práticas tayloristas. A exigência de melhores condições de trabalho e de relações fabris mais democráticas forçou a pesquisa dos novos métodos. Estudos feitos nos EUA na década de 70 revelaram a rebeldia dos trabalhadores. Segundo relatório de uma força-tarefa especial, criada pelo governo dos EUA, a produtividade das indústrias nesse país estava em plena queda no início dessa década. Aumentara o absenteísmo, a taxa de mobilidade no trabalho (turn-over), as paralisações violentas e a sabotagem. “Os produtos são de má qualidade e há relutância por parte dos trabalhadores em se empenharem em suas tarefas”, afirmou o relatório. Artigo na revista Fortune, em 1970, revelou que a taxa de absenteísmo dobrara na GM e na Ford “nos últimos dez anos”. As faltas no trabalho atingiam seu pico nas segundas e sextas- feiras, alcançando 10% dos horistas. Os atrasos também cresciam, “o que dificulta o início do trabalho nas linhas de montagem. O clima de tensão é maior nas fábricas, com reclamações e brigas constantes”. A mesma rebeldia informal foi observada em vários outros países, principalmente durante os radicalizados protestos na Europa em 1968. Estes e outros fatores levaram as corporações a importarem as técnicas japonesas de gerenciamento. Tempo do mercado Uma das primeiras técnicas difundidas pelo mundo foi o just-in- time, ou trabalho no “tempo certo”. Ela foi elaborada originalmente nos EUA no início do século XX por iniciativa do magnata dos automóveis Henry Ford, mas não saiu do papel. Só no Japão destruído pela II Guerra é que ela encontrou condições favoráveis para ser aplicada pela primeira vez. O ex-gerente da montadora Toyota, Taiichi Ohno, foi o responsável pela cópia e sistematização das antigas idéias de Henry Ford e por sua viabilização nessa fábrica de veículos. Daí a origem dos termos toyotismo ou ohnoismo. Posteriormente, as idéias de Ohno se disseminaram para quase todas as empresas do país, sempre com os pesados subsídios do Estado. Tanto que ele é considerado um dos gurus do “milagre japonês”. Na década de 50, as indústrias de automóvel dos EUA tinham uma produtividade oito vezes superior ao do Japão. Em menos de 20 anos, ocorreu a inversão no ranking mundial. O just-in-time envolve a produção como um todo – trabalhadores, gerências e até clientes e fornecedores. Seu objetivo é “produzir o necessário, na quantidade necessária e no momento necessário”, o que é vital numa fase de crise do capitalismo, onde a disputa pelo mercado exige produção ágil e diversificada. Para atingir essas metas, o sistema remodela o desenho das fábricas, encurtando os espaços de circulação das peças. Ele também reduz o tempo de troca de ferramentas, aproximando as seções chaves, e subordina a produção à demanda do mercado. Cabe ao setor de vendas o papel de detonador do processo produtivo, que só fabrica o que estiver encomendado. Isso reduz os estoques e a necessidade de capital de giro. O just-in-time diminui o desperdício de tempo na produção, forçando os trabalhadores a realizarem várias operações sempre nos prazos fixados pelo setor de vendas. Ele permite generalizar uma proposta há muito defendida por escolas européias e estadunidenses: a da constituição de “ilhas de produção” ou grupos de tecnologia (group technology). Ao invés da linha de montagem, usada na fase inicial da industrialização para controlar o trabalho, as “ilhas de produção” facilitam a operação em equipamentos mais avançados. Ela possibilita maior intensificação do ritmo de trabalho, já que reduz a ociosidade ou porosidade, que são os tempos em que o operário aguarda o término de uma operação na linha de montagem. Além disso, as “ilhas” dão maior mobilidade à mão-de-obra, que desta forma pode ser deslocada através de vários processos fabris de acordo com a conveniência da empresa num dado momento. O just-in-time também estimula a chamada polivalência, o que não significa o fim do trabalho rotineiro e embrutecedor. Ao contrário. Ela se dá com base em operações simples sem qualquer exigência de especialização no serviço. Por último, esse sistema eleva a concorrência entre os próprios trabalhadores, forçando que os próprios se fiscalizem e controlem o trabalho em “equipe” nas ilhas de produção. Após o seu sucesso no Japão, o just-in-time começou a ser implantado nos EUA no final da década de 60. Já no Brasil, a primeira empresa a usá-lo foi a Toyota, localizada em São Bernardo do Campo, em 1976. Rapidamente, segundo a consultoria Coopers & Lybrand, cerca de 700 empresas brasileiras passaram a adotar esse método, que não parou mais de crescer no país. “Os empresários brasileiros são obrigados a eliminar desperdícios e otimizar a produção para enfrentar a concorrência das empresas estrangeiras”, justificou na época o engenheiro Victor Báez, diretor da Coopers, para “vender o seu peixe”. O baixo custo para a implantação do just-in-time é outro motivo da sua vertiginosa expansão. De acordo com cálculos da mesma consultoria, as empresas conseguem, em média, retorno de quatro a oito vezes o valor investido no sistema já no primeiro ano de sua implantação. Logo no início da sua implantação no Brasil, uma reportagem do jornal Folha de S.Paulo mostrou as lucrativas vantagens do just-in-time. Citou o exemplo da Vison, pequena indústria de lingerie no bairro paulistano de São Matheus. Antes de implantar o sistema, ela demorava cerca de 28 dias para fabricar seus produtos; depois, passou a produzir a mesma mercadoria no máximo em dois dias. A fábrica foi subdividida em seis ilhas de produção, cada uma responsável pela confecção de oito a dez produtos diferentes – numa espécie de mini-fábrica. Antes cada costureira realizava uma única operação; depois, passou a executar de três a quatro tarefas diferentes e simplificadas, e cada funcionário tornou-se inspetor de qualidade do seu próprio trabalho. A produção passou a ser orientada pela demanda do mercado. Ao invés de tentar vender o que produzia, a Vison só fabricava o que já estava encomendado. Com isso, reduziu seus estoques de produtos fabricados de dois meses para apenas 15 dias. O custo da produção (mão-de-obra, matéria-prima e outras despesas de fabricação), que em 89 engolia 34,8% da receita da empresa, caiu para 26,1% graças ao just-in-time. Qualidade da exploração Outra técnica toyotista é o chamado CCQ – Círculo de Controle de Qualidade. A exemplo do just-in-time, esse sistema também foi gestado nos EUA, mas não encontrou terreno para ser aplicado nas empresas do país. Dois cientistas estadunidenses, Edward Deming e Josephy Juran, convidados pelo governo japonês para auxiliarem na reconstrução industrial do pós-guerra, foram os responsáveis pelo desenvolvimento dessa técnica no Japão. O primeiro registro de funcionamento de um CCQ data de 1962. Segundo o administrador e consultor de empresas Cláudius D’Artagnan Barros, vários fatores explicam a facilidade de implantação do CCQ no Japão. Alguns dos mencionados são bastante elucidativos. Ele cita a “cultura fortemente disciplinada” dos japoneses; a difícil situação econômica do pós-guerra; a ausência de sindicatos classistas; e a força da ideologia dominante, que faz com que os trabalhadores “coloquem como a coisa mais importante à empresa, de onde tiram o seu sustento, e depois a família”. O programa CCQ é bastante simples. Consiste na formação de pequenos grupos de trabalhadores – de seis a 12 funcionários –, que se reúnem periodicamente para propor medidas de melhoria da produção. Essa estrutura caminha paralelamente à hierarquia da empresa. Os “circulistas” continuam subordinados às chefias, suas sugestões têm caráter indicativo e não há mudanças do sistema de trabalho – diferentemente das “ilhas de produção”. Se as propostas formuladas pelos também chamados “times” forem aceitas pela direção patronal, o circulista recebe prêmios em dinheiro ou recompensas simbólicas, como um almoço com a diretoria da empresa ou a foto publicada no jornal interno da firma. Os manuais dos CCQs, que raramente são divulgados aos trabalhadores, são enfáticos ao reafirmarem o poder sagrado da hierarquia. Como aconselha Bearddsley, um dos expoentes teóricos desse programa, “é preciso dizer logo de início que continuaremos a gerenciar nossas empresas após a implantação dos Círculos de Qualidade. Na verdade, será muito mais fácil administrar o nosso pessoal... Não se está simplesmente entregando a administração da empresa a ele (o trabalhador)”. Apesar da sua simplicidade, o CCQ representa um grande achado para o patronato. Através de técnicas refinadas de envolvimento, ele possibilita absorver os conhecimentos acumulados pelos responsáveis diretos da produção. Desde o nascimento do capitalismo que a burguesia observa que os operários retêm certas informações temendo demissões. O CCQ visa exatamente estimular a criatividade do trabalhador e liberar as suas iniciativas para que ele apresente as soluções necessárias à redução de custos e à elevação de produtividade. Além disso, os círculos acirram a concorrência entre os próprios assalariados. O próprio uso do termo “qualidade” é pura mistificação, já que o objetivo não é a melhoria da mercadoria para o consumidor, mas sim a chamada qualidade de conformação – como produzir com o mínimo custo e de acordo com as especificações e prazos da gerência. Hoje, inclusive, é notório que as empresas utilizam a filosofia da “obsolescência planejada”, o que significa que a mercadoria é produzida de tal forma que só dura o suficiente para expirar o prazo de garantia ou o vencimento da última prestação do consumidor. Por todas essas vantagens, o CCQ é uma das técnicas mais aceitas nas empresas brasileiras. Isso também se deve tanto à sua operacionalidade, já que não exige maiores investimentos e nem altera a estrutura da empresa, e à sua enorme aplicabilidade. O CCQ é facilmente implantado em qualquer setor da economia. Além disso, o patronato brasileiro tem usado esse sistema para envolver os trabalhadores e afastá-los do sindicato. As primeiras indústrias a usarem esse programa no Brasil foram a Johnson & Johnson, em São José dos Campos, e a Volkswagen, em São Bernardo do Campo, em meados da década de 70. O gerente da primeira empresa, Oleg Greshner, é considerado o introdutor do CCQ no Brasil. São visíveis os resultados positivos desse programa na redução dos custos e no aumento da produtividade no país. Estudo do engenheiro de produção Mário Salermo, que pesquisou 18 empresas que implantaram o CCQ, demonstra como essa técnica é altamente lucrativa para o capital. Das 1.762 sugestões formuladas por esses círculos, 74% resultaram em redução dos custos de produção. Ele cita inclusive alguns casos em que as propostas dos circulistas tiveram como conseqüência a demissão de companheiros! O CCQ é um dos pontos altos da chamada “administração participativa”, uma escola de organização do trabalho que tem longa história. Já na década de 30, empresários e “cientistas” dos EUA e da Europa propunham o uso de vários recursos para forjar um clima de harmonia no local de trabalho. É dessa época que surgem as correntes de “relações humanas”, do enriquecimento individual das tarefas e outras, que nesse período ainda não tiveram maior acolhida das empresas. Durante o fascismo na Itália, os empresários também tentaram aproveitar a clima de medo para introduzir alguns modelos “participativos”. Giovani Agnelli, presidente da Fiat, fez esforços para “higienizar” a sua poderosa indústria, afastando o “perigo comunista”. O dopolavoro, imposto nessa fábrica de automóveis, tinha como objetivo organizar as atividades recreativas e culturais dos operários nos seus tempos livres de modo a integrá-los por todos os meios ao mundo do trabalho. A idéia era impor a imagem da empresa como “uma grande família”, onde predominaria o consenso, o respeito à hierarquia e a paz social. Quanto ao kanban, citado no início desse artigo, esse é mais um sistema de informação para administrar o just-in-time. Também oriundo do Japão, a palavra significa sinal. Através de cartões e outros instrumentos visuais, a empresa dá sua ordem de produção. Esse mecanismo ajuda a controlar de forma rigorosa o ritmo de trabalho, indicando o tempo de operação, o seu fluxograma (a seqüência de tarefas) e a qualidade padrão desejada na fábrica. Entre outras conseqüências, ele faz com que o operário agregue as funções de inspeção e supervisão, o que reduz o número de funcionários não envolvidos diretamente na produção. Ratoeiras do capital Diante do exposto, sintetizamos algumas conclusões sobre essas novas técnicas de dominação do capital: 1- Elas resultam num maior controle sobre os trabalhadores. Se antes, para impor o regime de exploração, era necessária uma disciplina férrea na fábrica, agora o empresariado se utiliza também de métodos mais requintados para manipular e envolver os explorados. O poder do patronato, que considera a empresa um local sagrado, não é alterado. Pelo contrário. Ele é reforçado, permeando toda a estrutura da empresa. Como afirma David Jenkins: “Ceder um pouco de poder aos trabalhadores pode ser um dos melhores meios para aumentar a sua sujeição, se isso lhes der a impressão de influir sobre as coisas”. Esse é o objetivo maior dos métodos participativos ou das ilhas de produção – as novas “ratoeiras do capital”. Essas inovações visam aperfeiçoar os métodos de manipulação dos operários. Quanto a isso não pode haver ilusão ou a crença de que essas técnicas são neutras. Toda a história da organização capitalista do trabalho mostra que o patronato visa sempre basicamente dois objetivos: o econômico, que é o do crescimento e da acumulação de capital; e o político, que é o de manter a submissão dos trabalhadores para garantir o primeiro intento. Há inúmeros estudos que comprovam que muitas vezes a burguesia sacrifica a eficiência econômica para conseguir desqualificar, desorganizar e envolver os trabalhadores, minimizando a possibilidade do surgimento de conflitos do interior das fábricas. 2- Elas geram maior concorrência entre os trabalhadores, incentivando a disputa por melhores índices de produtividade e absorvendo os conhecimentos retidos no contato diário com a máquina. Nesse rumo, elas inclusive transferem certas funções de supervisão e inspeção para os próprios operários, dividindo-os e criando um clima de vigilância permanente entre os companheiros de trabalho. 3- Na busca de maior produtividade e de menor custo de produção, elas resultam também no aumento do desemprego e da desqualificação profissional. As sugestões dos CCQs, a eliminação do tempo dito ocioso (porosidade) e exercício de dupla função (operação e supervisão) são usados para justificar as demissões. Quanto à polivalência, estudos demonstram que as operações desenvolvidas são ainda mais padronizadas e repetitivas. O operário “polivalente” alimenta mais de um tipo de máquina, o que não significa que seja especializado em cada uma delas. A polivalência visa dar maior flexibilidade ao trabalho, possibilitando que o trabalhador esteja sempre ocupado produtivamente. 4- Esses outros sistemas de gerenciamento são um pré-requisito para que a empresa introduza, com menos risco e melhores resultados, máquinas de tecnologia mais avançada. São um meio caminho para elevar a automação. Além de domesticar o trabalhador, sistemas como os das “ilhas de produção” redesenham as fábricas, facilitando a troca de maquinário antigo por robôs e máquinas-ferramentas com CNC. 5- Por último, só para enfatizar, todas essas técnicas modernas visam aumentar a extração de mais-valia do trabalhador, gerando maiores lucros para os capitalistas. Esse artigo é uma versão revisada do texto publicado na revista Princípios nº 22. O próximo abordará os impactos dessas mudanças na subjetividade do trabalhador. * Altamiro Borges é jornalista, membro do Comitê Central do PCdoB, editor da revista Debate Sindical e organizador do livro “A reforma sindical e trabalhista no governo Lula” (Editora Anita Garibaldi). Bibliografia - Braverman, Harry. “Trabalho e capital monopolista”. Editora Zahar, Rio de Janeiro, 1980. - Pereira, Duarte. “A ditadura nas fábricas”. Editora Hucitec, São Paulo, 1981. - Gorz, André (org.). “Divisão social do trabalho e modo de produção capitalista”. Editora Escorpião, Porto, 1976. - Fleury, Maria T.L. e Fischer, Rosa Maria (org.). “Processo e relações do trabalho no Brasil”. Editora Atlas, São Paulo, 1985. - Bruno, Lúcia e Saccardo, Cleusa (org.). “Organização, trabalho e tecnologia”. Editora Atlas, São Paulo, 1986. - Tragtenberg, Maurício. “Administração, poder e ideologia”. Editora Cortez, São Paulo, 1989. - Toledo, José Carlos de. “Qualidade industrial”. 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