A Bolivia no limite de uma guerra civil
30/09/2003
- Opinión
Desde 2002 os movimentos sociais bolivianos haviam anunciado que se o
governo de Sanchez de Losada insistisse em exportar o gás boliviano
através de portos chilenos ao México e aos EUA, contra a rejeição ampla
da população, que pede a industrialização interna do gás, haveria uma
"guerra civil" no país. Diante da decisão do governo de seguir adiante
com seus planos, o que se vê agora no país vizinho é o que pode ser
exatamente o começo de uma guerra civil.
A greve geral decretada pela Central Operário Boliviana (COB) segue em
frente, dois terços do país está paralizado, com uma onda generalizada de
protestos, que fazem com o movimento reflita uma série de outras
reivindicações e descontentamentos que levam a um isolamento geral do
governo e a uma ampla mobilização social e política que questiona a
continuidade do mandato de Sanchez de Losada.
Ele havia sido eleito por uma ampla maioria no Congresso, contra o
candidato dos movimentos sociais e das comunidades indígenas. O país é
majoritariamente indígena: os censos indicam que a população auto-
identificada como indígena é de 61,21%, que correspondem justamente aos
setores mais pobres da população – residem no campo, onde está 90% da
pobreza da Bolívia.
Depois dos massacres do que chamam de "fevereiro negro" de 2003, em que
morreram mais de 30 pessoas, o governo de Losada não conseguiu se
recuperar. Ao contrário, acelerou seus planos repressivos, mediante uma
chamada "Brinquedo raivoso", expressa numa "instrução militar
extraordinária anti-distúrbios", para ser posta em prática por Agrupações
Táticas Anti-distúrbios, fortemente armadas. Criminaliza-se o protesto
social com a pena de cinco a oito anos de prisão para os que realizem
bloqueios "dos transportes públicos, por terra, ar ou água", em condições
que foi exatamente com este tipo de mobilização que os trabalhadores
bolivianos conseguiram evitar que o governo anterior, de Hugo Banzes,
privatizasse a água, num dos movimentos mais importantes nessa luta
mundial pelo direito à água.
Estendem-se os casos de corrupção no governo, ao mesmo tempo que o
governo tenta colocar em prática um novo e duro ajuste fiscal, de que faz
parte a venda do gás boliviana, quando as empresas petrolíferas não estão
pagando os impostos e o governo pretende diminuir pela metade as
aposentadorias dos trabalhadores.
Desde o começo de setembro haviam recrudecido as marchas e as
mobilizações de vários setores populares, entre eles os aposentados, os
professores, policiais, militares, camponeses, indígenas, trabalhadores
sem terra. Depois de deflagrada a greve, o movimento passou a exigir a
renúncia de Sanchez de Losada, que responde com a militarização de várias
cidades. O movimento, que tem no líder indígena Felipe Quisque, sua
principal cabeça, exige que o governo cumpra com os acordos das
mobilizações anteriores, em relação a terras, máquinas e créditos aos
trabalhadores rurais.
O clima geral faz prever grandes enfrentamentos e perspectivas de que o
isolamento do governo o leve ou à renúncia ou à sua definitiva
militarização. O Brasil tem que colocar sua atenção no que ocorre no país
vizinho, parceiro nos projetos de integração regional, que vive uma
situação que pode desembocar em uma crise de proporções que a América
Latina não viu ainda neste último período.
https://www.alainet.org/es/node/108492?language=es
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