O Finado e o Político

17/08/2003
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Com a morte de Roberto Marinho, dono de um império de comunicações endividado, veio à tona, um capítulo constrangedor da hipocrisia de políticos, hoje governantes. No passado recente, os hoje donos do governo, alardeavam em comícios e na mídia alternativa, de que o senhor Roberto Marinho era mentiroso, manipulador, defensor da ditadura, da repressão e, responsável por grande parte da miséria de nosso Brasil. Esses políticos governantes, negando tudo o que diziam e pensavam, há poucas semanas atrás, decretaram luto oficial ao país (depois da morte de Roberto Marinho), bem como teceram elogios ao passado "nobre" deste senhor, atribuído-lhe méritos que não os teve a exemplo de ter dedicado toda uma vida de trabalho pelo Brasil e a educação do povo brasileiro. Depois deste capítulo de hipocrisia se constata que no seio dos governos a mentira, a subserviência e os interesses pessoais ou de pequenos guetos corporativos se sobrepõem aos ideais políticos de combate às injustiças sociais. Passadas duas semanas da morte do finado se entende porque o governo se curvou, uma vez mais, ao império decadente: foram os apoios às chamadas reformas e a conseqüente defesa, nos telejornais, do governo no processo de negociações das referidas reformas; o "fritamento" dos que se manifestavam contrários a elas; as luzes ou brilhos que o império propiciaria ao presidente da República no "Fantástico" de domingo 17 de agosto, quando Lula e a Primeira Dama, mostraram a intimidade com que lidam com o poder palaciano. A adesão ao império decadente deveria se amparar no limite da diplomacia e não extrapolar para o indecente "puxa saquismo". Foi constrangedor para os militantes do PT e a toda a nação brasileira ouvir dos políticos governantes que esse senhor foi um mestre na educação do povo brasileiro. Com essa atitude o governo brincou com a sanidade de milhões de cidadãos comprometidos com um Brasil diferente deste que Roberto Marinho e sua família fazem os telespectadores engolir todos os dias. O presidente da República ultrapassou os limites da infinda paciência militante e anarquizou com a fidelidade ao passado e a leitura sociológica dos fatos e dos acontecimentos da história do Brasil dos últimos 50 anos. O governo brasileiro, por causa de "certos favores imediatistas" e das luzes das câmeras globais transformou em "mestre santo" um sujeito que pensou o Brasil para as oligarquias, pensou a política para os corruptos, a economia para os mega-investidores e a comunicação como espaço de manipulação da verdade e venda de ilusões. Para a empresa de Roberto Marinho a comunicação deve ser monopólio e não espaço de democracia, de livre expressão, de livre manifestação, de arte e cultura. Para eles comunicação é sinônimo de poder ou atrelamento a ele, para dele tirar vantagens econômicas e políticas. A Globo de Roberto Marinho nunca quis um Brasil diferente, que tivesse por base a distribuição de renda e terra, com crianças na escola, sem fome, sem miséria, sem violência, sem prostituição. A Globo sempre defendeu a ditadura (Sarney, Maluf, ACM, Collor, FHC). A Globo sempre orientou os governos para o alinhamento com o capital voltado para o mercado e com o sistema financeiro internacional que oprime os habitantes de nosso continente, que oprime os brasileiros. A Globo sempre esteve com o poder. Essa verdade não pode ser esquecida ou negada pelos políticos que governam o nosso "amado Brasil". A hipocrisia tem limites na razão e na verdade. Depois da submissão ao finado, quando o governo atribuiu a ele, méritos que não os teve, cabe ao presidente Lula, o político, um exame de consciência, para quem sabe voltar seu olhar e passar a governar para os sujeitos-cidadãos encarnados na mais cruel das realidades, o Brasil de verdade, sem luzes e holofotes, sem brilhos ou maquiagens. * Roberto Antonio Liebgott - Cimi Sul Equipe Chapecó
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