em defesa da reforma agrária e da agricultura familiar
Carta da Terra
21/04/2003
- Opinión
As organizações que compõem o Fórum Nacional pela Reforma
Agrária e Justiça no Campo - acreditando na urgência da
democratização do acesso à terra e à água - defendem a realização
de uma ampla reforma agrária e o fortalecimento da agricultura
familiar, pois só elas garantirão o direito ao trabalho para a
população rural, historicamente excluída, e a produção de
alimentos para o mercado interno, estruturando o caminho para a
soberania alimentar para nosso país.
As entidades do Fórum defendem, por isso, a criação e a
implementação de um Plano Nacional de Reforma Agrária e a
construção de alternativas de desenvolvimento rural sustentável e
solidário para o Brasil, que alterem radicalmente o atual modelo
de desenvolvimento agropecuário, excludente, predatório e
concentrador de terra, renda e poder. Com este objetivo, lutam
para:
1 – a desapropriação dos latifúndios como o caminho constitucional
para garantir a função social da terra; uma legislação que limite
o tamanho das propriedades rurais através de emenda constitucional
e o confisco integral de todas as terras onde houver trabalho
escravo, exploração de trabalho infantil, cultivo de plantas
psicotrópicas e daquelas usadas para práticas de contrabando ou
adquiridas mediante práticas ilegais;
2 – o respeito aos direitos humanos no campo, combatendo todas as
formas de violência e o fim da impunidade; o reconhecimento e a
demarcação das terras das comunidades indígenas e das áreas de
remanescentes de quilombos; a criação de reservas extrativistas; a
formulação de políticas públicas que respeitem a organização
sócio-cultural e as formas de apropriação e uso dos recursos
naturais dos índios e quilombolas e de populações como os
ribeirinhos, seringueiros, quebradeiras de coco e outras;
3 – o planejamento da produção familiar que leve em consideração
as diversidades regionais, sua viabilidade e sustentabilidade
econômica, social e ambiental com linhas de crédito de custeio e
investimento acessíveis, com programas de seguro agrícola e de
serviços de assistência técnica pública, gratuita e de qualidade e
com garantia de preços mínimos justos e de comercialização da
produção;
4 – a implantação de agroindústrias populares nos municípios do
interior, nas diversas formas cooperativas e associativas, para as
quais sejam destinados prioritariamente os recursos públicos, para
melhorar a renda das famílias e promover um processo de
interiorização do desenvolvimento e da economia solidária;
5 – a produção de sementes pelos próprios agricultores e
agricultoras, inclusive com incentivos às iniciativas populares de
resgate das sementes crioulas, como forma de garantir as sementes
como patrimônio da humanidade. Para tanto, combatem o
patenteamento de seres vivos e a liberação da produção comercial e
uso de sementes transgênicas, indutoras de monopólio que destrói a
soberania dos agricultores e são nocivas ao meio ambiente e à
saúde humana;
6 – o desenvolvimento e a disseminação de novas técnicas agrícolas
não agressivas ao meio ambiente, implantando sistemas
agropecuários sustentáveis que eliminem o uso de agrotóxicos; a
preservação dos recursos hídricos e a democratização do acesso a
fontes e mananciais de águas como bens públicos e patrimônio da
sociedade;
7 – a melhoria e o fortalecimento do sistema previdenciário
baseado na seguridade social, pública e universal, permitindo o
acesso e a permanência dos trabalhadores e trabalhadoras rurais no
Regime Geral da Previdência Social, garantindo uma vida digna à
população do campo;
8 – a implementação das diretrizes operacionais para a educação
básica – aprovadas pelo Conselho Nacional de Educação – nas
escolas no campo, localizadas prioritariamente nos projetos de
assentamentos, comunidades e distritos rurais, reforçando a
utilização de práticas educativas que tenham como referência a
terra e a água, a organização e a cultura do campo, facilitando o
acesso às escolas, combatendo o analfabetismo e garantindo o
direito de todos à educação de qualidade em todos os níveis;
9 – a garantia de igualdade de oportunidades e direitos para
mulheres e jovens que corrijam discriminações decorrentes de
práticas e sistemas sociais injustos, buscando sua inclusão social
a partir de ações afirmativas para que seu potencial organizativo
e suas habilidades produtivas sejam aproveitados na construção de
alternativas de desenvolvimento e de soberania;
10 – a elaboração de políticas públicas específicas para cada
região do País, sobretudo para as que sofrem com condições
climáticas adversas, com ênfase ao desenvolvimento de políticas de
convivência com o semi-árido brasileiro, especialmente o
nordestino (onde se concentra o maior número de agricultores e
agricultoras familiares) que, submetido ao esgotamento dos
recursos naturais, a práticas clientelistas históricas e a
tecnologias inadequadas, fica à mercê de programas compensatórios,
fazendo-se urgente uma política de desenvolvimento sustentável
para o mesmo.
Nesta luta pela reforma agrária e em defesa da agricultura
familiar, as entidades e movimentos sociais signatários desta,
querem fortalecer a solidariedade entre os povos do Continente
Latino-americano através da construção de mecanismos justos de
cooperação e comercialização. Posicionam-se, por isto, contrários
à criação da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA) que
representa o monopólio comercial estadunidense, inclusive das
multinacionais do setor de alimentação e que vem sendo imposta,
concretizando um modelo oposto às históricas lutas populares pela
democratização da terra, das riquezas e do poder. A continuidade
deste tipo de negociações e acordos requer a realização de um
plebiscito como forma de diálogo e participação ampla da população
nos mesmos.
As entidades esperam ainda que os órgãos públicos, em todos os
níveis de governo, sejam estruturados e organizados para
viabilizarem o Plano Nacional de Reforma Agrária, implementando as
políticas públicas definidas para sua área de atuação e que
construam alternativas de desenvolvimento para o meio rural,
garantindo qualidade de vida para a população brasileira.
Brasília, 22 de abril de 2003
(503 anos de colonização e domínio do latifúndio no Brasil)
CONTAG – MST – FETRAF-SUL/CUT - CPT – CÁRITAS – ANMTR – MPA – MAB
– CNBB - CMP - CONIC – CONDSEF – Pastorais Sociais/CNBB - MNDH –
MTL – ABRA – ABONG - APR – ASPTA – CAPOIB – Centro de Justiça
Global - CESE – CIMI – CNASI – DESER – ESPLAR – FASE – FAZER –
FEEAB – FIAN-Brasil – FISENGE - IBASE – IBRADES – IDACO – IECLB -
IFAS – INESC – MLST – PJR – REDE BRASIL – Rede Social de Justiça -
RENAP – SINPAF – TERRA DE DIREITOS
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