Expectativas e esperança
03/10/2002
- Opinión
O resultado das eleições no Brasil suscitou interesse no mundo inteiro.
Mas é sobretudo na América Latina que a eleição do Lula despertou a
convicção de que agora estão dadas as condições para desencadear uma nova
postura política, capaz de reverter a tendência das últimas décadas,
marcadas pelo agravamento da crise econômica.
Na semana passada, a cidade de Quito, no Equador, se tornou o ponto de
convergência das atenções de todo o continente americano, pelos diversos
encontros que lá se realizavam, em torno da questão da Alca, a Área de
Livre Comércio que os Estados Unidos querem impor apressadamente a todo o
continente. Tanto por parte das delegações oficiais que tentavam avançar
nas negociações, como por parte dos representantes de movimentos
populares que questionavam o acordo comercial, todos se davam conta que o
fato novo, capaz de reverter a situação, era a eleição do Lula no Brasil.
Em termos de América Latina, aflora com evidência a expectativa de que a
partir do novo governo brasileiro será possível fortalecer novamente a
unidade política dos diversos países, fundada na consciência de uma
identidade própria, que é preciso retomar com urgência, e torná-la
instrumento válido para um confronto coletivo diante das pressões de
submissão e de perda de soberania que o processo de globalização acelerou
nos últimos anos.
Com isto, a partir do resultado dessa eleição, o Brasil se tornou
depositário de uma esperança que ultrapassa suas fronteiras, e reforça
nossa responsabilidade de fazermos tudo o que estiver ao nosso alcance
para que não seja frustrada.
Aí se coloca o desafio, que agora precisa ser olhado com realismo, e ao
mesmo tempo com a força que o momento nos oferece.
E' urgente o discernimento entre expectativas imediatas, difíceis de
serem atendidas, e esperança de mudanças mais profundas, que levam tempo
para se concretizarem. Manter a esperança, mesmo com as demoras das
transformações, será a incumbência decisiva a ser garantida em conjunto
pelo próximo governo e pela cidadania.
Por isto, não é só um novo governo que vamos ter. Precisamos garantir uma
nova postura da cidadania diante do governo. E' uma nova correlação de
forças que é preciso alinhar. O novo governo precisará avalizar as
esperanças apontadas pelas eleições, garantindo a coincidência dos mesmos
objetivos a serem perseguidos por suas medidas administrativas. E a
cidadania precisará avalizar o esforço do governo, garantindo suporte
político e força social para superar as evidentes resistências por parte
de todo um pesado conjunto de heranças perversas que foram sendo
acumuladas ao longo da história.
Trata-se de reverter um processo. Para isto é preciso convergência de
esforços. E consciência das etapas a conseguir. O fato é que vivemos a
oportunidade de desencadear um tempo novo, de convergência política capaz
de transformações mais profundas, longamente esperadas.
Não podemos decepcionar a esperança. E' o compromisso que decorre destas
eleições, tanto para os eleitos como para os eleitores.
https://www.alainet.org/es/node/106570?language=en
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