Política como sedução
08/11/2002
- Opinión
A eleição de Lula propicia reflexões sobre formas de se fazer
política. Fazer política é exercer concretamente o poder. Vejo quatro
formas de exercício de poder.
Primeiro, a política do punho fechado. Trata-se do poder exercido
de cima para baixo e de forma autoritária. Há um só projeto político,
aquele do detentor do poder que pode ser um ditador ou uma classe
dominante. Eles simplesmente impõe o projeto e esmagam os alternativos.
Foi o que mais vigorou na história brasileira.
Segundo, a política do tapinha nas costas. É uma forma
disfarçada de poder autoritário. Mas diferencia-se do anterior porque
este se abre aos que estão fora do poder mas para atrelá-los ao projeto
dominante. Recebem algumas vantagens, desde que não constituam outro
projeto alternativo. É a conhecida política paternalista que desfibrou a
resistência da classe operária e corrompeu tantos artistas e
intelectuais. Funcionou entre nós especialmente a partir de Vargas.
Terceiro, a política das mãos estendidas. O poder é
distribuido entre vários portadores que fazem alianças entre si sob a
hegemonia do mais forte. Há alianças entre os que estão no poder e entre
os que estão na oposição. Desta forma se cria a estabilidade política e
se garante a governabilidade. Ela presidiu a nova democracia brasileira.
Quarto, a política das mãos entrelaçadas. Parte-se do fato básico
de que o poder está difuso nos movimentos e instituições da sociedade
civil e não apenas na sociedade política, nos partidos e no Estado. Esse
poder social e político pode convergir para algo benfazejo para todos.
A política das mãos entrelaçadas acontece quando o chefe de estado
se propõe a uma ampla dialogação com todos afim de repactuar os atores
sociais ao redor de um projeto comum mínimo. O pressuposto é: aquém e
além das diferenciações e interesses conflitantes, existe na sociedade, a
solidariedade mínima, a busca do bem comum, a observância de regras
consentidas e o respeito a valores de sociabilidade sem os quais
viraríamos uma matilha de lobos. As mãos de estendidas podem se
entrelaçar coletivamente. Mas para isso, precisa-se do exercício da
sedução.
Fazer política como sedução é o propósito do Presidente
Lula. Tenta seduzir a todos para aquelas visões e valores que estão
escondidos dentro de cada um como: amor mínimo ao povo brasileiro,
realização de um projeto-Brasil que beneficie a todos, prática do cuidado
com os mais penalizados, criação de desenvolvimento ecologica e
socialmente sustentado que gere empregos, melhores salários,
redistribuição de renda e potenciação do horizonte de esperança. Alguém
precisa ser inimigo de si mesmo para estar contra tais propósitos. A
arte de Lula é reencantar a política das coisas e seduzir as pessoas para
esse sonho benaventurado. Cada pessoa, cada setor e cada classe social
tem algo a aportar. Ele é a pessoa que reúne carisma, habilidade e
experiência para que todos se disponham efetivamente a dar sua
contribuição singular.
Razão têm as comunidades eclesiais de base quando cantam: "Sonho
que se sonha só, é pura ilusão. Sonha que se sonha juntos é sinal de
solução. Então, vamos sonhar juntos, sonhar em mutirão". Agora
convocados pelo Presidente Lula.
* Leonardo Boff, Teólogo
https://www.alainet.org/es/node/106542?language=en
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