Macroeconomia e estratégia
28/11/2014
- Opinión
Durante o século XX, a esquerda socialista que optou pela reforma progressiva e democrática do capitalismo, nunca teve ideias próprias ou originais, sobre política econômica. Mais do que isto, sempre que governou ou participou de governos de coalisão, depois da 1º GM, apoiou direta ou indiretamente, a política conservadora e a ortodoxia monetarista, para enfrentar as crises econômicas que se sucederam depois da guerra.
Como no caso de Rudolf Hilferding, que foi ministro da fazenda da Alemanha, em 1928, e promoveu a política monetarista rigorosa que acabou piorando a recessão, e aumentando o desemprego e a própria crise que culminou com a ascensão do nazismo e de sua “economia de guerra”. E o mesmo aconteceu com o partido laborista inglês, em 1929, e com a Frente Popular francesa, em 1936, que também adotaram a cartilha ortodoxa, para enfrentar a “crise dos 30”, mas fracassam nos dois casos.
A grande exceção, neste período, foi a socialdemocracia sueca que enfrentou a mesma crise, com uma política de acordo social e promoção ativa do crescimento e do pleno emprego. A despeito que seu sucesso seja inseparável do dinamismo regional produzido pela “economia de guerra” nazista.
Depois da 2º Guerra Mundial, a esquerda democrática, socialista e europeia só aderiu à teoria e às políticas de corte keynesiano, no final da década de 50. E mesmo assim, nas crises monetárias da Inglaterra e da Alemanha, de 1966 e 1972, os governos de Harold Wilson e Helmut Schimidt, respectivamente, voltaram-se para as receitas da ortodoxia monetarista, que depois se transformaram na bíblia macroeconômica do socialismo noeliberal dos anos 80/90.
Fora da Europa, e na América Latina em particular, depois da IIº G.M., seus governos desenvolvimentistas foram quase sempre conservadores e patrocinaram, em geral, políticas econômicas ecléticas, mantendo um pé na ortodoxia do “tesouro”, e o outro na heterodoxia do “planejamento” ou da “assessoria econômica” da presidência, como no Brasil de Getúlio Vargas e da maioria dos seus governos militares. Mas foi só a partir da segunda metade dos anos 80, que a discussão sobre politica econômica adquiriu verdadeira centralidade nos debates acadêmicos e políticos da esquerda latino-americana.
No vácuo ideológico criado pela crise socialista dos anos 90, cresceu a importância dos debates macroeconômicos desencadeando-se às vezes verdadeiras guerras religiosas dentro da esquerda em torno de divergências quase infinitesimais, aos olhos dos leigos. Neste período, o keynesianismo se transformou na língua oficial da maioria dos economistas de esquerda que também passaram a acreditar - como os economistas - na existência de politicas econômicas certas ou erradas, dependendo dos seus fundamentos teóricos, verdadeiros ou falsos. Apesar da conjuntura e da história apontarem numa direção oposta, como se pode ver pelo acompanhamento das politicas econômicas das principais economias capitalistas neste momento.
Senão vejamos, mesmo que seja a “vôo de pássaro”: desde a crise de 2008, os países da União Europeia adotaram politicas econômicas cada vez mais ortodoxas e rigorosas, mas seus efeitos do ponto de vista do crescimento e do emprego têm sido catastróficos; mas ao mesmo tempo a Inglaterra, seus antigos domínios e o os países escandinavos tem alcançado bons resultados imediatos com as mesmas políticas ortodoxas.
Do outro lado deste debate, EUA vêm tendo sucesso, neste mesmo período, com uma política monetária e fiscal absolutamente heterodoxas; a mesma política heterodoxa, entretanto que vem tendo efeitos desastrosos, no Japão do primeiro-ministro Shinzo Abe. E o mesmo está acontecendo em países de menor dimensão econômica, onde as políticas ortodoxas produziram resultados positivos, durante alguns anos, na Bolívia, Uruguai, Chile e Peru, e hoje está tendo resultados negativos, na maioria destes mesmos países. Ou seja, do ponto de vista conjuntural, tudo indica que as politicas econômicas dos países variam no espaço e no tempo, e seu sucesso ou fracasso depende de fatores “externos” à própria política econômica, e não da verdade ou falsidade de suas premissas teóricas.
Mas o que mais contradiz este “debate epistemológico” dos economistas, é o sucesso extraordinário do ecletismo chinês que muda suas regras e instituições segundo seus objetivos estratégicos, sem produzir nenhum tipo de susto nos investidores internacionais. Para entender este fenômeno, entretanto, é preciso recorrer a um estudo mais amplo e comparado da história das grandes potências econômicas capitalistas [1]. E neste caso, a conclusão do estudo parece apontar numa direção que também vai contra a convicção dos economistas: todos os “grandes ganhadores” seguiram estratégias expansivas e “mercantilistas” durante o seu período de take off´, até alcançar seus principais concorrentes. Nesta trajetória ascensional, estes países adotaram várias políticas fiscais e monetárias, ortodoxas ou heterodoxas, dependendo das circunstâncias e do juízo dos seus governantes sobre os desafios aos seus projetos de expansão do seu poder e da sua riqueza.
E a verdade é que em nenhuma destes casos, a instabilidade ou variação das políticas econômicas de curto prazo afetou a “credibilidade” fiscal ou monetária da economia destes países, durante o tempo em que eles conseguiram vencer e seguiram se expandindo, como no caso atual da China. Ou seja, no longo prazo, a importância da variação das politicas econômicas conjunturais se dissolve, transformando-se numa variável quase irrelevante, para a história de sucesso das grandes potências capitalistas.
[1] J.L.Fiori, ´”História, Estratégia e Desenvolvimento. Para uma Geopolítica do Capitalismo”, Editora Boitempo, 2014.
Como no caso de Rudolf Hilferding, que foi ministro da fazenda da Alemanha, em 1928, e promoveu a política monetarista rigorosa que acabou piorando a recessão, e aumentando o desemprego e a própria crise que culminou com a ascensão do nazismo e de sua “economia de guerra”. E o mesmo aconteceu com o partido laborista inglês, em 1929, e com a Frente Popular francesa, em 1936, que também adotaram a cartilha ortodoxa, para enfrentar a “crise dos 30”, mas fracassam nos dois casos.
A grande exceção, neste período, foi a socialdemocracia sueca que enfrentou a mesma crise, com uma política de acordo social e promoção ativa do crescimento e do pleno emprego. A despeito que seu sucesso seja inseparável do dinamismo regional produzido pela “economia de guerra” nazista.
Depois da 2º Guerra Mundial, a esquerda democrática, socialista e europeia só aderiu à teoria e às políticas de corte keynesiano, no final da década de 50. E mesmo assim, nas crises monetárias da Inglaterra e da Alemanha, de 1966 e 1972, os governos de Harold Wilson e Helmut Schimidt, respectivamente, voltaram-se para as receitas da ortodoxia monetarista, que depois se transformaram na bíblia macroeconômica do socialismo noeliberal dos anos 80/90.
Fora da Europa, e na América Latina em particular, depois da IIº G.M., seus governos desenvolvimentistas foram quase sempre conservadores e patrocinaram, em geral, políticas econômicas ecléticas, mantendo um pé na ortodoxia do “tesouro”, e o outro na heterodoxia do “planejamento” ou da “assessoria econômica” da presidência, como no Brasil de Getúlio Vargas e da maioria dos seus governos militares. Mas foi só a partir da segunda metade dos anos 80, que a discussão sobre politica econômica adquiriu verdadeira centralidade nos debates acadêmicos e políticos da esquerda latino-americana.
No vácuo ideológico criado pela crise socialista dos anos 90, cresceu a importância dos debates macroeconômicos desencadeando-se às vezes verdadeiras guerras religiosas dentro da esquerda em torno de divergências quase infinitesimais, aos olhos dos leigos. Neste período, o keynesianismo se transformou na língua oficial da maioria dos economistas de esquerda que também passaram a acreditar - como os economistas - na existência de politicas econômicas certas ou erradas, dependendo dos seus fundamentos teóricos, verdadeiros ou falsos. Apesar da conjuntura e da história apontarem numa direção oposta, como se pode ver pelo acompanhamento das politicas econômicas das principais economias capitalistas neste momento.
Senão vejamos, mesmo que seja a “vôo de pássaro”: desde a crise de 2008, os países da União Europeia adotaram politicas econômicas cada vez mais ortodoxas e rigorosas, mas seus efeitos do ponto de vista do crescimento e do emprego têm sido catastróficos; mas ao mesmo tempo a Inglaterra, seus antigos domínios e o os países escandinavos tem alcançado bons resultados imediatos com as mesmas políticas ortodoxas.
Do outro lado deste debate, EUA vêm tendo sucesso, neste mesmo período, com uma política monetária e fiscal absolutamente heterodoxas; a mesma política heterodoxa, entretanto que vem tendo efeitos desastrosos, no Japão do primeiro-ministro Shinzo Abe. E o mesmo está acontecendo em países de menor dimensão econômica, onde as políticas ortodoxas produziram resultados positivos, durante alguns anos, na Bolívia, Uruguai, Chile e Peru, e hoje está tendo resultados negativos, na maioria destes mesmos países. Ou seja, do ponto de vista conjuntural, tudo indica que as politicas econômicas dos países variam no espaço e no tempo, e seu sucesso ou fracasso depende de fatores “externos” à própria política econômica, e não da verdade ou falsidade de suas premissas teóricas.
Mas o que mais contradiz este “debate epistemológico” dos economistas, é o sucesso extraordinário do ecletismo chinês que muda suas regras e instituições segundo seus objetivos estratégicos, sem produzir nenhum tipo de susto nos investidores internacionais. Para entender este fenômeno, entretanto, é preciso recorrer a um estudo mais amplo e comparado da história das grandes potências econômicas capitalistas [1]. E neste caso, a conclusão do estudo parece apontar numa direção que também vai contra a convicção dos economistas: todos os “grandes ganhadores” seguiram estratégias expansivas e “mercantilistas” durante o seu período de take off´, até alcançar seus principais concorrentes. Nesta trajetória ascensional, estes países adotaram várias políticas fiscais e monetárias, ortodoxas ou heterodoxas, dependendo das circunstâncias e do juízo dos seus governantes sobre os desafios aos seus projetos de expansão do seu poder e da sua riqueza.
E a verdade é que em nenhuma destes casos, a instabilidade ou variação das políticas econômicas de curto prazo afetou a “credibilidade” fiscal ou monetária da economia destes países, durante o tempo em que eles conseguiram vencer e seguiram se expandindo, como no caso atual da China. Ou seja, no longo prazo, a importância da variação das politicas econômicas conjunturais se dissolve, transformando-se numa variável quase irrelevante, para a história de sucesso das grandes potências capitalistas.
[1] J.L.Fiori, ´”História, Estratégia e Desenvolvimento. Para uma Geopolítica do Capitalismo”, Editora Boitempo, 2014.
27/11/2014
https://www.alainet.org/en/node/165792
Del mismo autor
- O fracasso dos militares 02/02/2022
- O dilema de Taiwan, no berço da nova ‘ordem mundial’ 04/08/2021
- As estranhas derrotas de uma potência que não para de se expandir e acumular poder 16/07/2021
- Sete potências e um destino: conviver com o sucesso da civilização chinesa 25/06/2021
- As sanções norte-americanas à Rússia 29/04/2021
- A “flutuação pandêmica” do preço do petróleo 13/04/2021
- O fim do capitão ficou mais próximo 01/04/2021
- O futuro imediato do mundo, a partir de Biden 08/03/2021
- A confissão do general, o governo dos militares, e a derrota do chanceler 17/02/2021
- Transição energética e ecológica 13/11/2020