As eleições não são a batalha final
20/06/2010
- Opinión
As contradições desse modelo econômico certamente exigiram uma participação popular na política que vá além do calendário eleitora.
A campanha eleitoral deste ano à Presidência da República agora está oficializada. Ou seja, com as convenções nacionais realizadas nas últimas semanas, os principais partidos políticos formalizaram suas candidaturas.
É verdade que, nos últimos dias, a mídia corporativa tem se “preocupado” mais com a Copa do Mundo e a seleção brasileira. Mas o fato é que o tema eleitoral já era tema de pauta desde o ano passado, como “cortina de fumaça” para a crise econômica mundial e muito longe de qualquer debate sobre projeto estratégico para o país. Esta, aliás, deverá ser novamente a marca da campanha presidencial. Isto é , ausência total de verdadeiro debate de projeto político que encare os graves problemas estruturais do país.
O PT e o PSDB insistem em tratar a campanha como “plebiscitária” – deve-se escolher entre a continuidade do governo Lula ou o retorno ao período do governo FHC. No entanto, nos programas de governo de ambos os candidatos, não há nada que indique que a economia deixará de ser hegemonizada pelo capital financeiro. Isso se torna evidente nas semelhanças entre as propostas para a agricultura, que privilegiam o agronegócio, braço do capital internacional e especulativo no campo.
Mesmo a ideia de que se trata de um embate entre os governos Lula e FHC é sintomática desta despolitização. Por um lado, o PSDB, herdeiro de oito anos de governo FHC e há 16 anos no governo de São Paulo – o Estado mais rico do país e com vergonhosos índices sociais –, significa retomar as privatizações e retroceder nas relações internacionais com o hemisfério sul, realinhando o país subordinadamente aos Estados Unidos. Por outro, o atual governo abandonou bandeiras históricas do seu próprio partido e optou por não enfrentar o capital financeiro internacional. Ao contrário, estimulou setores poderosos da economia, como os próprios bancos e empreiteiras, e blindou-se com um apoio popular, misto de clientelismo com assistencialismo. Portanto, está longe de atender às bandeiras históricas da classe trabalhadora.
E, nesse cenário, nos setores de oposição, à esquerda ao governo Lula, vigora a fragmentação e o divisionismo característico dos período de descenso social. O período eleitoral é visto apenas como espaço de agitação política e, consequentemente, há dificuldade de se construir um projeto alternativo, capaz de aglutinar outros setores da sociedade. E, novamente, não se trata de nomes, mas sim de se atacar os problemas concretos e estruturais da sociedade brasileira.
No entanto, no conjunto dos movimentos sociais, há um esforço em construir plataformas políticas unitárias que tentam flexionar o debate eleitoral para as questões sociais e econômicas. É neste sentido que resultaram as propostas apresentadas pela Coordenação dos Movimentos Sociais, pelas conferências realizadas pelas diversas centrais sindicais, seja no polo da CUT-CTB ou no da Conlutas-Intersindical, e entre os movimentos da Via Campesina.
Há evidentemente uma compreensão deste conjunto de organizações de que aliança do PSDB com o DEM, representada pela candidatura de José Serra, significa a retomada do projeto privativista, a restituição da política de relações exteriores submissa ao império e a criminalização dos movimentos sociais.
Entretanto, os movimentos sociais também vêm insistindo que as eleições não são a batalha final. As conquistas da classe trabalhadora sempre se originaram nas ruas, nas lutas populares, sindicais e estudantis. É ali que a classe trabalhadora é forte e pode, realmente, se fazer ouvir.
As eleições – espaço político que poderia ser importante para apresentar projetos para o país e de elevar a consciência política da população brasileira – estão cada vez mais despolitizadas e mais dependentes do poderio econômico. São vergonhosas e imorais as milionárias cifras gastas para eleger os integrantes dos poderes Executivo e Legislativo em nosso país. Montantes que afastam os setores populares das disputas eleitorais e tornam candidatos reféns dos financiadores milionários. É crescente a sensação, em cada eleição, de que as doações às campanhas eleitorais se constituem em verdadeiros investimentos, feitos pelos grandes grupos econômicos, para os quatro anos seguintes. O que o país precisa é de um projeto de desenvolvimento econômico e social, que promova justiça social e a distribuição da renda e da riqueza produzidas em nosso país. Um projeto desses contraria os interesses dos grandes doadores das campanhas eleitorais. É por isso que, com a conivência dos partidos políticos, o parlamento se torna cada vez mais o espaço da pequena política.
Infelizmente, no Brasil, ainda penamos com o longo descenso das lutas de massas e com o rebaixamento da discussão política. Mas as contradições desse modelo econômico – que mesmo em período de crescimento econômico promove a desigualdade social – certamente exigiram uma participação popular na política que vá além do calendário eleitoral. As lutas sociais, a organização e a politização da classe trabalhadora e a implementação de um projeto popular para o país devem alicerçar as politicas que realmente promovam mudanças estruturais que assegurem condições dignas de vida ao povo brasileiro.
Editorial ed. 381 Brasil de Fato
https://www.alainet.org/en/node/142279?language=en
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