A paz possível
17/04/2003
- Opinión
Muitos temos sentido profundo abatimento por causa desta guerra
ilegítima e vergonhosa, movida contra o Iraque. Na verdade, não
foi uma guerra entre combatentes, mas uma invasão e um massacre.
Dada a violência "inteligente" nos perguntamos angustiados: Quem
somos nós, errático serzinho da Terra, perdido na imensidão do
espaço, capaz de tanto ódio e devastação? E nos envergonhamos de
nós mesmos. Merecemos ainda viver junto com os demais seres, já
que nos fizemos o Satã da Terra? Será que no processo de
evolução não surgirá outro ser com mais benevolência,
amorosidade e vontade de paz?
Mas de nada adianta pensar assim, pois seria fuga da dura
realidade. A realidade é que o governo Bush decidiu resolver os
problemas mundiais usando o que o faz imbatível,a guerra
tecnológica. Nestas condições é possível ainda a paz? Recusamo-
nos a aceitar a solução resignada de Freud respondendo em 1932 a
uma consulta de Einstein sobre a possibilidade de evitarmos a
guerra:"esfaimados pensamos no moinho que tão lentamente mói que
poderíamos morrer de fome antes de receber a farinha".
Acreditamos na paz possível sob duas condições: a primeira, de
acolhermos a polaridade amor-ódio, opressão-libertação, caos-
cosmos como pertencendo à condição humana, pois, somos a unidade
viva dos contrários; segunda, de reforçarmos de tal maneira o
pólo luminoso desta contradição que ele possa manter sob
controle, limitar e integrar o pólo tenebroso. Esse é o caminho
aberto pela sociedade civil mundial, preparado, há seculos, por
aquele que foi talvez o "último cristão e o "primeiro depois do
Único", Francisco de Assis. Encontramo-lo na "Oração de São
Francisco pela paz", rezada sempre nos encontros de líderes
religiosos do mundo inteiro, qual credo no qual todos se
encontram. Essa oração foi elaborada durante a primeira guerra
mundial, por um anônimo da Normandia, amante de São Francisco de
quem colheu o espírito e as principais palavras. Mas o fez de
forma tão fiel e verdadeira que se transformou na oração do
próprio São Francisco de Assis. A linguagem é religiosa mas a
mensagem é universal.
Não obstante seu enternecimento, chamando a todas as criaturas
de irmãos e irmãs, Francisco de Assis não perde o sentido da
realidade contraditória. Não se questiona porque é assim. Na
sabedoria dos simples, intui que o mal não está ai para ser
compreendido mas para ser superado pelo bem, que a parte sã cura
a parte doentia e que a luz integra as trevas na forma de
sombra. É só nesta medida que o mal deixa de ser totalmente
absurdo e se dilui no código de todas as coisas. Então suplica,
"onde houver ódio que eu leve o amor; onde houver ofensa, que eu
leve o perdão; onde houver discórdia que eu leve a união; onde
houver dúvida que eu leve a fé; onde houver erro, que eu leve a
verdade; onde houver desespero, que eu leve a esperança; onde
houver tristeza que eu leve a alegria; onde houver trevas que
que leve a luzŠ e importa mais consolar que ser consolado,
compreender que ser compreendido e amar que ser amado".
O efeito desta estratégia sapiencial é a paz, possível aos seres
contraditórios que somos e à essa Terra conturbada. É pouca
coisa, quase nada. Mas representa a força que se esconde em cada
semente, por menor que seja.
* Leonardo Boff. Teólogo.
https://www.alainet.org/en/node/107350
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