Com um amigo como Trump, a Europa não precisa de inimigos

29/01/2020
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Trump ficou magoado com a reação pouco entusiástica dos seus amigos europeus à execução do general Suleimani.

 

Seu parça, o secretário de Estado, Mike Pompeo, falou em nome do chefe: “Francamente, os europeus não foram prestativos como eu queria.”

 

Francamente, acho que os primeiro-ministros destas nações fizeram até mais do que seria lícito esperar deles.

 

Embora dando destaque a apelos de moderação ás partes em conflito, eles não deixaram de aprovar a ação americana, apesar de se tratar de uma violação das convenções de Genebra. Coisa que os éticos líderes europeus consideram altamente negativa para suas respectivas biografias.

 

Sendo também franco, noto que a normalmente fiel amizade europeia ao governo de The Donald não costuma ser retribuída por ele.

 

Pelo contrário, o presidente dos EUA já se acostumou a atacar ou ameaçar seus aliados do Velho Mundo como se fossem seus inimigos. O motivo foi sempre o mesmo: destruir posturas legítimas dessas nações, em nome dos interesses do governo e das empresas do país gerido pelo bizarro mandatário republicano.

 

Recentemente, nos bastidores do happening capitalista de Davos, o governo de Washington ameaçou os europeus com sua arma predileta: as sanções.

 

Tudo porque os automóveis desses países, muito apreciados pelos cidadãos dos EUA, vinham dominando o mercado local, desbancando os concorrentes americanos.

 

Em declarações à CNN, The Donald informou que curtiu “um grande papo” com o presidente da Comissão Europeia, deixando-o aterrorizado por suas ameaças: “Olhe”, disse,” se nós não conseguirmos algo, eu vou ter de entrar em ação e a ação será tarifas muito altas nos seus carros e outras coisas que venham de seu país (al Jazeera, 22-01-2020).”

 

Esse exigido “algo” seria um corte ou grande redução nos impostos de importação cobrados pelos membros da União Europeia.

 

E Trump confidenciou á CNN: “Eles não tem escolha”, não poderiam resistir a sobretaxas de 25%, que ele tem prontas na sua cartucheira.

 

Lembro que exportações de carros para os EUA são vitais para a França, Reino Unido e , especialmente, Alemanha.

 

Numa pausa das apresentações em Davos, outro dos parças do morador da Casa Branca, o secretário do Tesouro, Steve Mnuchin, manteve uma reunião interessante com o secretário ds Finanças da França, Bruno Le Maire.

 

O assunto foi o plano de Paris para taxar os serviços digitais, que, de acordo com Washington, prejudicaria as empresas americanas de tecnologia, diminuindo seus lucros. O que seria um pecado contra o América first, do presidente dos EUA.

 

The Donald reagira furiosamente: façam isso e se preparem para pagar 100% de direitos alfandegários sobre suas exportações aos EUA!

 

Sob a ameaça desta sanção de terríveis dois dígitos, a França teve de topar concessões: as taxas planejadas não seriam efetivadas neste ano, em troca os EUA guardariam os duros 100% nas gavetas da Casa Branca, enquanto as taxas francesas estivessem suspensa.

 

 No ano que vem, as discussões seriam retomadas.

 

 Macron reza para que seja com um governo democrata, possivelmente eleito em novembro deste ano, em vez de Trump.

 

Pouco antes de Davos, o Reino Unido anunciou que repetiria as taxas planejadas por Paris.

 

Prontamente, Steve Mnuchin afirmou que a taxação dos serviços digitais seria uma discriminação contra as gigantescas empresas americanas deste ramo. Em defesa dos sagrados lucros dessas empresas, o governo americano retaliaria, lançando taxas sobre as exportações de carros ingleses para os EUA.

 

Surpresa! Sajid Javid, chanceler do Reino Unido, clamou que, apesar das pressões, o reino de Sua Majestade resistia. E já em abril, começaria a aplicar a taxa vetada pela Casa Branca.

 

Acho que ele confia na amizade fraternal que Trump dedica a Boris Johnson, o primeiro-ministro do Reino Unido.

 

 Antes do início do evento de Davos, soube-se que The Donald estava pronto para lançar pesadas sanções sobre o gigantesco gasoduto Nord Stream 2.

 

Trata-se de um empreendimento da empresa russa Gazpron, com participação alemã. Quando concluído, deverá duplicar o fornecimento de gás natural aos países europeus e atender a 80% das necessidades da Alemanha

 

 Desde o ano passado, The Donald, de olho na conquista do mercado europeu para as companhias americanas de gás liquefeito, assestara suas baterias contra o Nord Stream 2. Seu principal argumento dirigia-se à Alemanha, sócia e principal destinatária do gás russo. Se os alemães, pontificou The Donald, continuarem comprometidos com a obra, dependerão do gás de Moscou e assim se tornarão reféns do insidioso Putin.

 

A primeiro-ministra Angela Merkel contestou: “Se durante a Guerra Fria… nós importamos grandes quantidades de gás russo, não sei porque hoje seria pior dizer que a Rússia permanece nossa parceira.”

 

Se fosse para mudar de fornecedor, em favor das empresas americanas, a Europa pagaria preços mais caros, além de ter de gastar um dinheirão na construção de instalações específicas para receber o gás líquido.

 

O morador da Casa Branca não se conformou e prometeu atacar com sua arma preferida, as sanções, que não arriscam a vida de um só militar americano e podem causar estragos brutais nas vítimas do big boss de Washington.

 

Mais uma vez lembrou que aqueles que negociarem com a Rússia jamais poderão negociar com os EUA, o seu mercado e as suas empresas.

 

Como a Alemanha não acenou com a bandeira branca, o chefe do governo yankee, apelou para uma manobra, eu diria, indigna de um gentleman (que afinal The Donald não é).

 

Mandou dois cortesãos, os senadores republicanos, Ted Cruz e Ron Johnson, atacarem pelo lado mais fraco: as empresas contratadas para os diversos serviços na execução do Nord Stream 2.

 

Eles procuraram essas companhias e ameaçaram, no estilo das rackets, que tiveram seu apogeu durante a proibição de bebidas alcoólicas nos EUA: “Os senhores tem uma escolha binária, parem AGORA e deixem o gasoduto inacabado ou façam uma tola escolha, apressando-se em concluir o gasoduto e se arrisquem a colocar suas empresas fora dos negócios para sempre.”

 

 Se as vítimas desta autentica chantagem afinarem, a Alemanha sofrerá um duro golpe (para a Rússia seria pior, mas Putin não merece lágrimas ocidentais). Perderá seus investimentos no Nord Stream 2 e sua chance de resolver da forma mais vantajosa seus problemas de energia, graças a The Donald.

 

Nada a estranhar. Afinal, o princípio basilar do América,first presidencial é a frase de John Foster Dulles, secretário de Estado do governo Dwight Eisenhower: ”Os EUA não tem amigos, tem interesses.”

 

Nada como um político que fala a verdade.

 

- Luiz Eça formou-se em Direito pela Universidade de São Paulo

 

28 / 01 / 20

https://www.olharomundo.com.br/com-um-amigo-como-trump-a-europa-nao-precisa-de-inimigos/

 

https://www.alainet.org/de/node/204459
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