Fim do pólo naval de rio grande: Mais uma consequência trágica do golpe!
- Opinión
Não seria um equívoco dizer que o problema hoje enfrentado pela indústria naval brasileira, em especial a do Município de Rio Grande (RS), é uma tragédia anunciada. Trata-se de uma consequência esperada do golpe de estado executado no Brasil em 2016 e uma das bandeiras da “Ponte para o Futuro” de Michel Temer. O próprio signatário deste artigo, em texto publicado em 13 de abril de 2016, afirmou, literalmente:
“[…] se o golpe sair vencedor do Parlamento, não tenham dúvidas que a nacionalização da produção dos insumos do petróleo e do gás vai ser abandonada e, novamente, vamos ver o Brasil comprando plataformas exclusivamente da China, dos “Tigres Asiáticos” e dos Estados Unidos”.
Mais do que privatizar serviços e a economia, uma das bandeiras do grupo que dá sustentação a Michel Temer, e que inclui o PMDB, o PSDB, o DEM, o PSD e outros partidos de menor envergadura, é desnacionalizar a economia. Abrir mercados, transnacionalizar a produção e deixar o país atrativo para o “mercado financeiro”. Pois cada emprego perdido em Rio Grande, em São José do Norte e em outras cidades do Rio de Janeiro, Pernambuco e Bahia, estados onde também havia uma ascendente indústria naval, representa bilhões de reais em ganhos de capital para um minúsculo grupo de pessoas que joga no “Cassino da Avenida Paulista” chamado BOVESPA.
Não se enganem, o mercado de ações exige liquidez de capital, nunca a inversão financeira em produção direta. Quanto maior foi a possibilidade de conversão das ações em ganhos de capital, mesmo que isto represente a perda de postos de trabalho, mais interessante é para bancos, financeiras e todo o mercado financeiro. É um ensinamento básico do capitalismo selvagem, reificado, distante, sem pessoas, sem famílias, sem trabalho, mas com ganhos lucrativos e estratosféricos ao custo da fome e da miséria de milhões.
Se é verdade que em alguns países os grandes detentores de capital, quando morrem, ou ainda em vida, dedicam parte da sua renda para fundações com destinos “humanitários” (bem entre aspas), também é verdade que as suas práticas selvagens de especulação financeira não possuem nada de humanitárias.
Segundo dados do Sindicato dos Metalúrgicos de Rio Grande, a indústria naval hoje beneficia economicamente e de forma direta mais de 50 mil pessoas, e esta população está abrigada nas cidades de Rio Grande, Pelotas, São José do Norte, Capão do Leão e Santa Vitória do Palmar. Se olharmos a cadeia produtiva e de serviços como um todo, os dados são muito mais expressivos, pois beneficiam todos os segmentos econômicos destas cidades de alguma forma. Logo, o desmonte do sistema pode representar uma tragédia gigantesca para toda a Zona Sul do Estado, com resultados alarmantes e que devem ter resultado imediato em todos os setores, do comércio à construção civil, dos serviços (hotelaria, educação, assistência, segurança, etc.) ao mercado de bens duráveis (veículos, eletrodomésticos, etc.).
No centro da discussão, para os menos informados, está a política de petróleo e gás introduzida no Governo Lula, na qual a Petrobrás passou a comprar as suas plataformas no Brasil, dando preferência à indústria nacional. Tal política, que gerou milhares de postos de trabalho em vários lugares do país, e alimentou um grande crescimento da economia, inclusive enfrentando a crise de 2008, foi reforçada com a descoberta do Pré-sal, inclusive com a transferência dos recursos obtidos para o investimento em políticas de educação e meio ambiente.
Tudo, absolutamente tudo isto, foi perdido quando Michel Temer (PMDB/SP) assumiu o poder. Aliás, nesse meio tempo ocorreu uma articulação entre José Serra (PSDB/SP), Romero Jucá (PMDB/RR), Renan Calheiros (PMDB/AL), Eduardo Cunha (PMDB/AL) e Aécio Neves (PSDB/MG), para aprovar o fim do “fundo social do pré-sal” e o fim da prioridade da indústria naval nacional nas compras públicas da Petrobrás (na verdade, de todas as estatais). O argumento era o de abrir o mercado e criar empregos, só esqueceram de destacar que tais empregos seriam criados na Ásia.
Em síntese, nada do que se vê hoje em Rio Grande está distante do cenário imposto pela agenda da “Ponte” de Michel Temer. E o resultado tem sido uma tragédia social sem fim. Pessoas são tratadas como meras peças em um jugo de tabuleiro onde a grande maioria perde e apenas um grupo minúsculo, que representa menos de 1% da população, ganha muito dinheiro.
Mas não pensem que este problema termina com o desmonte da indústria nacional, a coisa é bem maior, mais grave, e está associada à “Reforma da Previdência” e à “Reforma Trabalhista”. Não tenho dúvidas de que Temer e seus seguidores vão iniciar em breve a chantagem: “você prefere trabalhar hoje e se aposentar aos setenta anos [se não morrer até lá], ou manter-se desempregado e garantir aposentadoria com trinta e cinco anos de um serviço que você não tem”; ou, então, “você prefere ter a garantia do FGTS para o futuro e continuar sem emprego, ou abandonar esta garantia para um futuro incerto e ter um emprego agora”. Ou seja, o discurso de ataque aos direitos dos trabalhadores já está montado e, para tanto, elevadas taxas de desemprego são fundamentais. É muito mais fácil obrigar uma massa desesperada a se submeter a um regime de ausência de direitos, do que uma sociedade sadia e bem alimentada.
Nunca podemos esquecer que outro alvo direto desta agenda de ódio e de desmonte do estado também é a política ambiental. A PEC 65/2012 já está tramitando no Congresso e, com ela, o fim do licenciamento ambiental. O argumento chantagista deve ser o mesmo “você prefere guardar umas plantinhas e um conhecimento indígena que ninguém domina para o futuro, ou ter um emprego hoje”. Trata-se, portanto, de uma agenda articulada, onde pouco importa, como já advertimos antes, a falta de popularidade de Michel Temer.
O grande aliado desta onda golpista e de massacre aos mais básicos direitos de cidadãos e cidadãs é o silêncio. Enquanto silenciamos, e aceitamos com passividade um momento que nunca chega, estamos vendo o nosso presente e o nosso futuro sendo destruídos. Talvez, esperar até 2018 para mudar, seja tarde demais…
Sandro Ari Andrade de Miranda, advogado, mestre em ciências sociais.
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