As tarifas do transporte e o sistema político

22/01/2015
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Embalado pela onda privatizadora dos anos de ofensiva neoliberal, o então prefeito de São Paulo, Paulo Maluf, em abril de 1994, acabou com uma grande experiência nos transportes urbanos municipais, a Companhia Municipal de Transportes Coletivos (CMTC). Foi mais uma privatização carregada de suspeitas, em que os custos da fiscalização e operação continuavam a recair sobre a municipalidade e os ganhos das melhores linhas eram repassados para empresas privadas num processo em que abundaram denúncias de corrupção. Perdemosuma empresa de qualidade, com trabalhadores que recebiam uma remuneração superior aos colegas das empresas privadas e com a capacidade de enfrentar a crescente demanda paulistana por um transporte público de qualidade.
 
 Desde então, a cidade de São Paulo converteu-se em mais uma vítima de empresas privadas cuja lógica é reduzir ao máximo o número de viagens, aproveitando os momentos de pico, reduzindo os investimentos na renovação da frota e manutenção dos veículos, submetendo os trabalhadores a salários baixos e péssimas condições de trabalho, fraudando o número de viagens e chantageando permanentemente a população para elevar as tarifas. Por mais que se ampliem os corredores de ônibus – medida essencial para valorizar o transporte público – continuamos com um péssimo serviço, que acaba incentivando o uso do automóvel, ampliando apoluição, causando aumento no número de acidentes e prejuízos econômicos gigantescos com os permanentes engarrafamentos.
 
 Tanto as péssimas condições do transporte público, com ônibus, metrô e trens cada vez mais lotados, quanto os baixos salários de seus trabalhadores são reflexos da lógica privada com a qual esse setor funciona no país. Mais uma herança do neoliberalismo. As prefeituras acabam chantageadas pelos empresários, elevando tarifas e reproduzindo um sistema inviável que favorece o transporte privado e o trânsito caótico. A falta de investimentos públicos nos últimos anos fez com que o Metrô de São Paulo se tornasse o mais superlotado do mundo, com uma média de 10 milhões de passageiros por quilômetro de linha. Denúncias de corrupção apontam que os governos estaduais converteram os investimentos necessários em “caixinhas de campanha eleitoral”. E não foi pouco. Estima-se que as transnacionais Siemens e Alstom, acusadas de formação de cartel, tenham faturado juntas R$ 12,6 bilhões nos contratos com o Metrô até 2008.
 
 As manifestações de junho de 2013, deflagradas pela luta contra o reajuste das tarifas em São Paulo e Porto Alegre, mostraram a dimensão da insatisfação com o péssimo transporte público em todo o país. Este ano, assistimos a retomadas das manifestações em várias cidades contra o reajuste de tarifas. Os reajustes, em alguns casos superiores à inflação acumulada, pesam especialmente sobre os trabalhadores informais que não contam com o Vale Transporte.
 
 É preciso estatizar o transporte público, mas sabemos que só isso não basta. Empresas privadas de transporte e fornecimento de peças estão entre as principais financiadoras de candidatos em nosso apodrecido sistema político. A luta contra a elevação das tarifas e estatização das empresas de transporte se casa com a campanha pela realização de um Plebiscito que decida a convocação de uma Constituinte Soberana e Exclusiva do Sistema Político.
 
 O caso do Metrô de São Paulo é emblemático. Mesmo com uma empresa pública, quando não enfrentamos o sistema político reproduzimos o terrível ciclo de fornecedores que financiam os candidatos em troca de vantagens ilegais. Os escândalos que envolvem empresas transnacionais como a Alston e a Siemens comprovam isso. Sem enfrentar o financiamento privado, continuaremos a vivenciar o terrível ciclo onde os eleitos pagam através de seus mandatos o que receberam nas campanhas.
 
É fundamental relacionar a luta contra os reajustes das tarifas de transporte com a campanha pela Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político, fortalecendoa campanha pela aprovação de um plebiscito em que todo o nosso povo possa decidir se deseja mudar, com a profundidade necessária, o atual sistema que somente favorece os lucros e a corrupção
 
- Editorial da edição 621 do Jornal Brasil de Fato
 
21/01/2015
https://www.alainet.org/de/node/167007
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